Ele desligou a cafeteira e ambos seguiram para a sala de jantar. O lustre, assim como a
cafeteira, fora deixado aceso e cinco das oito lâmpadas estavam queimadas. Uma das pontas
da mesa retangular tinha um prato de comida inacabado. Na cabeceira oposta, havia uma caixa
de papelão com o nome da vinícola local impresso na lateral. Gabriel levantou uma das abas e
investigou o conteúdo. Estava cheia de objetos cuidadosamente embrulhados com o jornal
Corriere della Sera. Achou o jornal um tanto erudito para um homem como Falcone. Ele tinha
mais cara de leitor da Gazzetta dello Sport.
— Parece que ele saiu com pressa — comentou Chiara.
— Ou talvez tenha sido forçado a sair.
Gabriel pegou um dos objetos da caixa e desembrulhou o jornal com cuidado,
revelando um fragmento côncavo de cerâmica mais ou menos do tamanho de sua palma,
decorado com a imagem parcial de uma jovem meio de perfil. Ela estava com um vestido
plissado e parecia tocar um instrumento similar a uma flauta. A pele e a vestimenta foram
retratados no mesmo marrom terracota, mas o fundo fora pintado com um preto reluzente.
— Meu Deus — murmurou Chiara.
— Parece o pedaço de algum recipiente ático de pinturas vermelhas.
Chiara assentiu.
— A julgar pela forma e imagem, eu diria que veio da parte de cima de um stamnos, um
vaso grego usado para transportar vinho. Com certeza a mulher é uma mênade, uma discípula
de Dionísio. O instrumento é uma flauta de bambu com duas saídas, conhecida como aulo.
— Poderia ser uma cópia romana de um original grego?
— Suponho que sim. Mas o provável é que tenha sido produzido na Grécia há 2.500
anos, especificamente para ser exportado às cidades etruscas. Os etruscos eram grandes
admiradores dos vasos gregos. Por isso que tantas peças importantes foram encontradas em
tumbas etruscas.
— E o que isso está fazendo numa caixa de papelão na mesa de jantar de Roberto
Falcone?
— Essa é a parte fácil. Ele é um tombarolo.
Um ladrão de túmulos.
— Isso explicaria o cachorro — concluiu Gabriel.
— E as botas enlameadas. É óbvio que ele andou fazendo escavações recentemente. —
Ela ergueu o jornal. — É da semana passada.
Gabriel vasculhou a caixa de novo e pegou outro embrulho de jornal. Dentro, estava
uma parte diferente do vaso, mostrando o rosto de outra mênade e seu cílice, um recipiente
raso usado para tomar vinho. Ele examinou a imagem em silêncio antes de ler o jornal. Era o
trecho de uma matéria sobre uma curadora do Vaticano que cometera suicídio se jogando do
domo da Basílica de São Pedro. O relato não mencionava que ela fazia um inventário secreto
da coleção de antigüidades do Vaticano, que, pelo visto, a levara até aquele lugar, o lar de um
tombarolo. Talvez só isso fosse suficiente para explicar sua morte, mas Gabriel suspeitava que
havia algo mais.
Ele olhou de novo para o fragmento de cerâmica e o aproximou do nariz. Sentiu o
resquício de uma substância química, não muito diferente do cheiro dos solventes que ele
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1