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Piazza di Spagna, Roma
Gabriel possuía um único terno. De design italiano e feito pelo Escritório, o traje tinha
compartimentos secretos para esconder passaportes falsos e um coldre costurado na cintura da
calça, grande o bastante para sustentar uma pistola Beretta e um pente extra. Depois de pensar
muito, ele decidiu que seria pouco sensato levar uma arma de fogo ao jantar de Cario
Marchese. Ele deu um nó na gravata azul-clara que Chiara comprara mais cedo numa loja na
Via Condotti e colocou um lenço de seda no bolso do paletó. Chiara fez ajustes sutis nos dois
acessórios antes de entrar no banheiro para terminar de se maquiar. Ela estava usando um
vestido longo preto e meias da mesma cor. Seu cabelo pendia solto sobre os ombros
descobertos e, no pulso direito, havia o bracelete de pérolas e esmeraldas que Gabriel lhe
dera de presente em seu último aniversário. Chiara tinha uma beleza estonteante, pensou ele, e
era jovem demais para estar com alguém tão acabado.
— Melhor você se vestir — disse ele. — Temos que sair em poucos minutos.
— Você não gostou do que estou usando?
— O que há para não gostar?
— Então, qual é o problema?
— É um tanto provocativo — respondeu ele, percorrendo o corpo da esposa com o
olhar. — Afinal, é um jantar com um padre.
— Na casa de sua antiga amante. — Ela passou um pouco de pó de arroz nas
bochechas para destacar os tons dourados de seus grandes olhos castanhos. — Devo admitir
que estou curiosa para conhecer a mulher que conseguiu penetrar a armadura de Donati.
— Você não vai ficar desapontada.
— Como ela é?
— Um par perfeito para Donati se ele tivesse escolhido outra ocupação.
— É mais que uma ocupação. E tenho certeza que não foi uma questão de escolha.
— Você acredita que seja uma vocação?
— Sou filha de um rabino. Eu sei que é uma vocação. — Chiara examinou sua
aparência no espelho por um instante antes de retomar a maquiagem em seu rosto
extraordinário. — Agora você percebeu que eu tinha razão sobre Donati desde o começo. Eu
disse que ele tinha um passado oculto. E avisei que estava escondendo algo nesse caso.
— Ele não teve escolha.
— Sério?
— Se ele tivesse dito que pretendia me enviar para combater um mafioso como Cario
Marchese, eu teria terminado o Caravaggio e deixado a cidade o mais rápido possível.
— Ainda é uma opção.
Gabriel desviou o olhar, deixando claro que, para ele, não era.
— Você não tem idéia de onde está se metendo, querido. Eu cresci neste país. Eu o
conheço melhor que você.
— Nunca soube que o gueto judeu de Veneza era um ninho de atividades mafiosas.