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King Saul Boulevard, Tel Aviv
— Ele diz que seu nome é David Girard. Mas, assim como quase tudo a seu respeito,
isso é mentira.
Gabriel soltou a pasta com documentos na mesa executiva ridiculamente grande de Uzi
Navot. Era feita de vidro fumê e ficava perto das janelas à prova de balas que iam do teto ao
chão, dando vista para o centro de Tel Aviv e para o mar. Uma iluminação fraca entrava pela
veneziana vertical, aprisionando Navot nas barras de escuridão. Ele não tocou na pasta e, com
um gesto, incentivou Gabriel a continuar.
— Seu nome real é Daoud Ghandour. Ele nasceu no vilarejo de Tayr Dibba no sul do
Líbano, na mesma cidade que Imad Mughniyah, ou seja, eles devem ter se conhecido quando
jovens.
— Como ele foi de um buraco como Tayr Dibba até uma galeria de antigüidades em St.
Moritz?
— Da maneira libanesa — respondeu Gabriel. — Em 1970, Arafat e a OLP abriram
negócios no sul do Líbano e a família Ghandour se mudou para Beirute. Pelo visto, Daoud era
uma criança de inteligência excepcional. Ele foi para uma boa escola e aprendeu a falar
francês e inglês. Na hora de cursar uma faculdade, foi morar em Paris para estudar a
Antigüidade na Sorbonne.
— Foi aí que Daoud Ghandour se tornou David Girard?
Isso só aconteceu quando ele seguiu para Oxford. Depois de terminar o doutorado em
arqueologia clássica, começou a trabalhar no departamento de antigüidades da Sotheby's, em
Londres. Ele estava lá no final dos anos 1990, época em que a casa de leilões foi acusada de
vender antigüidades de proveniência desconhecida. Ele saiu de Londres sob suspeita.
— E abriu o próprio negócio?
Gabriel assentiu.
— Quanto custa abrir uma galeria em St. Moritz?
— Muito.
— Onde ele conseguiu o dinheiro?
— Boa pergunta.
Gabriel pegou uma foto entre os documentos e a empurrou para o outro lado da mesa.
Mostrava um homem magro de quase 50 anos apoiado numa vitrine cheia de cerâmicas gregas
e etruscas. Ele vestia um pulôver e um blazer escuros. Seu olhar era suave e pensativo. O
sorriso encenado até parecia genuíno.
— Bonitão — falou Navot. — Onde você conseguiu a foto?
— No site da galeria. A biografia oficial tem algumas falhas bem grandes, como o
nome de batismo e o local de nascimento.
— Qual é o passaporte que ele carrega hoje em dia?
— Suíço. Ele também tem uma esposa suíça.
— De que tipo?
— Falante de alemão.