Gabriel serviu-se de mais um copo de vinho e contou a Tziona sobre
Viena.
ELA ABRIU A porta e puxou a corda que acendia a luz do teto. O
armário estava cheio de telas e esboços de alto a baixo. Gabriel começou a
folhear o trabalho. Tinha-se esquecido quão talentosa era a sua mãe.
Conseguia ver as influências de Beckmann, Picasso, Egon Schiele e, claro, do
seu pai, Viktor Frankel. Até havia variações nos temas que Gabriel tinha
explorado no seu próprio trabalho na altura. A sua mãe tinha-os
desenvolvido ou, nalguns casos, destruído completamente. Ela tinha sido
espantosamente talentosa.
Tziona empurrou-o para o lado e saiu com uma pilha de telas e de
grandes envelopes cheios de esboços. Gabriel agachou-se no chão de pedra
e examinou os trabalhos enquanto Tziona observava por cima do ombro.
Havia imagens de campos. Camaratas a abarrotarem de crianças.
Mulheres trabalhando como escravas em maquinaria de fábricas. Corpos
empilhados como lenha, à espera de serem arremessados ao fogo. Uma
família abraçando-se enquanto o gás a envolvia.
A tela final tinha uma figura solitária pintada, um homem das SS
completamente vestido de negro. Era a pintura que tinha visto naquele dia,
no estúdio da mãe. Enquanto os outros trabalhos eram escuros e abstratos,
neste ela empenhara-se no realismo e na revelação. Gabriel estava
maravilhado com o seu impecável traço e pincelada antes de os seus olhos
se fixarem no rosto do sujeito. Pertencia a Erich Radek.
TZIONA PREPAROU uma cama no sofá da sala para Gabriel e
recitou-lhe a midrash do vaso quebrado.
— Antes de Deus criar o mundo, havia apenas Deus. Quando Deus
decidiu criar o mundo, Deus parou para criar o espaço para o mundo. Foi
nesse espaço que o universo foi formado. Mas agora, nesse espaço não
havia Deus. Deus criou centelhas divinas, luz, para serem colocadas na
criação de Deus. Quando Deus criou a luz, e colocou a luz dentro da criação,
recipientes especiais foram preparados para a guardar. Mas houve um
acidente. Um acidente cósmico. O recipiente quebrou. O universo ficou
cheio de centelhas da luz divina de Deus e cacos de recipientes.
— É uma bela história — disse Gabriel, ajudando Tziona a entalar
as pontas de um lençol nas almofadas do sofá. — Mas o que tem a ver com
minha mãe?
— A midrash ensina que enquanto as centelhas da luz de Deus não