Morte em Viena

(Carla ScalaEjcveS) #1

um obstáculo. Ramirez parecia insultado.
— Monsieur Duran, estou seguro que tenho muito mais experiência
em perseguir homens como Erich Radek do que você. Eu sei quando devo
investigar discretamente e quando devo escrever.
Gabriel hesitou um momento. Estava relutante em entrar num quid
pro quo
com o jornalista argentino, pois sabia que Alfonso Ramirez podia
ser um amigo valioso.
— Por onde começamos? — perguntou Gabriel.
— Bem, penso que primeiro devemos descobrir se Alois Brunner
estava dizendo a verdade sobre o seu amigo Otto Krebs.
— Quer dizer, se chegou a vir para a Argentina?
— Exatamente.
— E como fazemos isso?
Nessa hora o garçom apareceu. O bife que colocou em frente de
Gabriel era grande o suficiente para alimentar uma família de quatro
elementos. Ramirez sorriu e começou a dar ao serrote.
— Bon appétit, Monsieur Duran. Coma! Algo me diz que vai precisar
de forças.


ALFONSO RAMIREZ DIRIGIA o último Volkswagen Sirocco
sobrevivente no hemisfério ocidental. Talvez tivesse sido azul-escuro em
tempos; agora, o exterior tinha o aspecto de uma pedra pomes. O para-
brisas estava partido ao meio em forma de raio. A porta de Gabriel estava
amolgada, e era preciso muito da sua reserva de forças só para a abrir. O ar
condicionado já não funcionava e o motor rugia como um avião.
Aceleraram pela Avenida 9 de Julho com as janelas abertas. Pedaços
de papel flutuavam à volta deles. Ramirez parecia não notar, ou não se
importar, quando várias páginas foram sugadas para fora. Tinha ficado
mais quente ao fim da tarde. O vinho grosseiro deixou Gabriel com dor de
cabeça. Virou a cara para a janela aberta. Era uma avenida feia. As fachadas
de edifícios antigos estavam pejadas por uma infindável parada de cartazes
apregoando carros de luxo alemães e bebidas não alcoólicas americanas
para uma população cujo dinheiro desvalorizara subitamente. Os ramos
das árvores de sombra pendiam embriagadas perante o assalto da poluição
e do calor.
Viraram em direção ao rio. Ramirez olhou para o retrovisor. Uma
existência sendo perseguido por rufias militares e simpatizantes nazistas
deixaram-no com os instintos bem afiados.
— Estamos sendo seguidos por uma moça numa scooter.

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