Morte em Viena

(Carla ScalaEjcveS) #1

vidro que lhe explodira na cara. Uma enfermeira de cabelo preto curto e
olhos muito azuis verificava o soro. Olhou para o quarto das visitas e por
instantes reparou em Gabriel antes de voltar ao trabalho. Os seus olhos não
se enganavam.
Zvi, depois de deixar Gabriel um momento sozinho, caminhou até o
vidro e atualizou-o sobre o estado clinico do colega. Falou com a precisão
de um homem que já tinha visto muitos programas médicos na televisão.
Gabriel, com os olhos fixos no rosto de Eli, apenas ouviu metade do que o
diplomata estava a dizer — o suficiente para perceber que o seu amigo
estava às portas da morte, e que, mesmo que sobrevivesse, provavelmente
nunca mais seria o mesmo.
— De momento — concluiu Zvi — as máquinas mantêm-no vivo.
— Porque é que tem os olhos ligados?
— Fragmentos de vidro. Conseguiram tirar a maior parte, mas
ainda tem uma meia dúzia alojada nos olhos.
— Vai ficar cego?
— Não se saberá enquanto ele não estiver consciente — disse Zvi.
Em seguida acrescentou pessimista:
— Se voltar a estar.
Um médico entrou no quarto. Cumprimentou Gabriel e Zvi com um
movimento de cabeça, em seguida abriu a porta de vidro e entrou na cabina
protetora. A enfermeira afastou-se da cama e o médico tomou o seu lugar.
Ela deu a volta e colocou-se aos pés da cama em frente ao vidro. Pela
segunda vez o seu olhar cruzou-se com o de Gabriel, subitamente fechou a
cortina soltando-a com um puxão preciso do pulso. Gabriel caminhou até o
bali seguido por Zvi.
— Está bem?
— Vou ficar bem. Só preciso de um minuto sozinho.
O diplomata voltou para dentro. Gabriel apertou as mãos atrás das
costas como um soldado à vontade, e afastou-se devagar pelo familiar
corredor. Passou o posto das enfermeiras. A mesma paisagem banal das
ruas de Viena via-se da janela. O cheiro também era o mesmo — a
desinfetante e a morte.
Chegou a uma porta entreaberta com o número 2602-C. Empurrou-
a gentilmente com a ponta dos dedos e esta abriu-se silenciosamente. O
quarto estava escuro e desocupado. Gabriel espiou por cima do ombro. Não
havia enfermeiras por perto. Esgueirou-se para dentro e fechou a porta
atrás de si. Deixou as luzes apagadas e esperou que os olhos se
habituassem à escuridão. Em breve o quarto estava visível: a cama vazia, a

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