Público - 15.10.2019

(C. Jardin) #1

16 • Público • Terça-feira, 15 de Outubro de 2019


SOCIEDADE


Obra foi visitada durante campanha eleitoral pelo primeiro-ministro

PAULO PIMENTA

The Lancet diz que SNS


não responde a necessidades


da população


Pagamentos a cargo das


famílias atingiram um valor


recorde em 2018,


ultrapassando a fasquia dos


5 mil milhões de euros


Saúde


Alexandra Campos


[email protected]

Ministério diz que alargamento de valências tem sido uma aposta

Os gastos com a saúde a cargo dos
doentes “já representam 28% da des-
pesa total”, uma factura que em Por-
tugal” é signiÆcativamente mais ele-
vada do que a média da União Euro-
peia (15%)”, sublinha a prestigiada
revista cientíÆca The Lancet num edi-
torial publicado no sábado e em que
defende que o Serviço Nacional de
Saúde (SNS) “não vai ao encontro das
necessidades da população” e preci-
sa de ser encarado como uma priori-
dade pelo novo governo.
Num breve balanço a propósito dos
40 anos do SNS, desaÆa-se o novo
governo português a não deixar “pas-
sar esta nova oportunidade para prio-
rizar a saúde” e tornar o seu acesso
“possível para todos”, criticando a
“falta de investimento no SNS”, que
“está a impedir a modernização dos
hospitais e a substituição do material
médico obsoleto” e a desmotivar os
trabalhadores do SNS, que, devido às
“precárias condições de trabalho”,
procuram emprego “no sector priva-
do e no estrangeiro”.
Começando por enfatizar o “exce-
lente progresso nos indicadores de
saúde” dos portugueses, nomeada-
mente a descida da mortalidade infan-
til e o aumento da esperança média
de vida para 81,3 anos, “um valor mais
elevado do que o da média da UE”,
The Lancet faz vários alertas, lembran-
do que “os políticos enfrentam em
Portugal problemas nos dois extremos
do espectro de idades”: a taxa de
pobreza infantil está acima da média
da UE e a população envelhecida “está
doente e com pouca qualidade de vida
nos últimos anos”.
“Apesar de não ser muito exausti-
vo, este editorial traça um retrato real
e lança um desaÆo: Portugal não
pode perder a oportunidade para
priorizar a saúde” diz o bastonário da
Ordem dos Médicos, Miguel Guima-
rães, que partilhou ontem o texto no
Facebook. “O que nos custa é a dimi-
nuição da qualidade de alguns dos
indicadores em que nos destacamos.
Tivemos indicadores muito bons,


demos um salto enorme, mas o inves-
timento é insuÆciente e os proÆssio-
nais Æcam desmotivados”, lamenta.
“Estamos numa situação difícil, a
procura aumentou, mas a oferta não
correspondeu. É preciso investir
mais, mas os hospitais não têm liber-
dade, nem autonomia para poderem
ter uma gestão Çexível. A gestão é
anquilosada, controlada pelas Finan-
ças”, critica.
O editorial da revista mereceu tam-
bém destaque no site do Sindicato
Independente dos Médicos (SIM), que
recorda que o editorial “está em linha
com o que referiu, neste sábado, 12
de Outubro, o Presidente da Repúbli-
ca”. Marcelo Rebelo de Sousa aÆrmou
que há que esperar para ver “qual a
prioridade dada à Saúde” no Orça-
mento do Estado para 2020.

Acima da média europeia
O Ministério da Saúde responde aos
reparos da The Lancet, lembrando
que “o alargamento das valências do
SNS tem sido uma aposta em cuida-
dos de saúde tradicionalmente não
cobertos como Medicina Dentária,
Psicologia, Nutrição ou Medicina Físi-
ca e Reabilitação”. E especiÆca que
84% dos agrupamentos de centros de
saúde já têm gabinete de dentista,
98% têm consulta de psicologia e
80% de nutricionista, entre outras
valências.
Quanto ao facto de em Portugal a
fatia da despesa das famílias estar aci-
ma da média europeia, Miguel Gui-
marães não mostrou surpresa. “As
pessoas precisam de ter respostas
com maior rapidez. Por isso é que em
2014 a percentagem de portugueses

PAULO PIMENTA

com seguros privados era de 24% e no
Ænal de 2018 já ascendia a 37%”,
exempliÆcou.
Para o especialista em economia da
saúde Pedro Pita Barros, mesmo sem
ser possível indicar um valor, “é
razoável pensar-se que o SNS não
recebe as verbas que necessita para
o serviço assistencial que lhe é pedi-
do”. Sinal disso é, frisa, “o acumular
de dívidas pelos hospitais, só reduzi-
das por verbas extraordinárias”.
De resto, o crescimento da despesa
das famílias com a saúde em Portugal
não é novidade. Já se sabia que a fac-
tura paga pelos cidadãos tem vindo a
aumentar, nalguns anos a um ritmo
superior ao da despesa pública, nou-
tros anos a um ritmo inferior. Em
2018, segundo os dados do Instituto
Nacional de Estatística que ainda são
provisórios, a despesa das famílias
com a saúde ascendeu a 27,7% do total
dos gastos em saúde. É o dinheiro que
os cidadãos pagam para além daque-
le com que Ænanciam o SNS através
dos impostos.
O Ministério da Saúde lembra que
“se há instituições que são especiÆca-
mente vocacionadas para a saúde
pública”, como a DGS e o Instituto
Ricardo Jorge, “é preciso não esque-
cer que há várias outras, nos cuidados
de saúde primários e nos hospitais,
que concorrem para a promoção da
saúde e que podem não ser especiÆ#
camente identiÆcadas em termos de
Çuxos Ænanceiros”. Recorda ainda
que a prevenção da doença e a pro-
moção da saúde tem sido uma aposta
do Governo e do ministério.

Ala pediátrica
Patrícia Carvalho

As obras da nova ala
começaram a 25 de
Setembro, mas montagem
do estaleiro só fica pronta
no fim deste mês

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Ontem não havia ruído, movimenta-
ções, nem pessoas dentro da área
delimitada para o estaleiro da futura
ala pediátrica do Centro Hospitalar
Universitário de São João (CHUSJ),
no Porto, mas a obra que foi visitada
durante a campanha eleitoral pelo
primeiro-ministro (e então candida-
to) António Costa não está parada,
garante fonte do hospital. Um escla-
recimento que surge depois de foto-
graÆas mostrando o espaço inactivo
terem sido publicadas e partilhadas
na Internet, com a alusão a que o
anunciado início dos trabalhos seria
uma manobra eleitoral.
O arranque das obras foi publici-
tado pelo próprio CHUSJ, em comu-
nicado que dava conta de condicio-
namentos e alterações na circulação
no espaço do hospital a partir do dia
25 de Setembro “por motivo do iní-
cio das obras da ala pediátrica”. A 1
de Outubro, um novo comunicado
indicava que, naquela terça-feira,
tinha começado “a montagem do
estaleiro para a construção” do novo
espaço do São João, que irá congre-
gar vários serviços de pediatria e
representa um investimento global
de 25 milhões de euros. O documen-
to indicava ainda que a montagem

São João: Não se vê


actividade no estaleiro


mas hospital garante


que obra não está parada


do estaleiro antecipava “o início efec-
tivo da empreitada”, que tem um
prazo de 18 meses.
No dia seguinte, a 2 de Outubro,
António Costa fazia uma breve visita
ao estaleiro e foi questionado sobre
a conveniência de começar as obras
em pleno período eleitoral. O então
candidato socialista argumentou que
“mais conveniente era mesmo já ter
sido possível inaugurar a obra”.
Este Æm-de-semana, o socialista
Tiago Silva publicou no Twitter uma
fotograÆa do estaleiro da ala pediá-
trica, que dizia ter sido captada a
meio da semana passada, sem qual-
quer sinal de actividade, e com a
frase em tom irónico: “Como se pode
ver, as obras da nova ala pediátrica
do São João que Costa foi visitar em
campanha eleitoral estão a decorrer
a um ritmo estonteante.” “A vergo-
nha quando nasceu passou por esta
gente a correr”, acrescentava.
Ao PÚBLICO, fonte do CHUSJ
garante, contudo, que não há qual-
quer atraso nos prazos anunciados.
“Está tudo a correr dentro da nor-
malidade. Já tínhamos indicado que
a montagem do estaleiro duraria
cerca de um mês”, garante o respon-
sável pela assessoria de imprensa do
hospital. A mesma fonte aÆrma que,
apesar da aparente inactividade que
se tem veriÆcado nas últimas sema-
nas, o estaleiro estará completamen-
te montado até ao Ænal de Outu-
bro.
A futura ala pediátrica terá cinco
pisos e vai acolher especialidades
totalmente dedicadas às crianças.
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