Público - 15.10.2019

(C. Jardin) #1
Público • Terça-feira, 15 de Outubro de 2019 • 31

CIÊNCIA


Visitante interestelar tem uma


cauda curta e é avermelhado


É ligeiramente avermelhado, tem
uma cabeleira longa e uma cauda cur-
ta. Estas são algumas das caracterís-
ticas do cometa 2I/Borisov, o segundo
objecto interestelar que conseguimos
detectar. Publicado ontem na revista
Nature Astronomy, este é o primeiro
retrato do cometa e mostra que a sua
cor e morfologia são semelhantes às
de outros cometas do nosso sistema
solar.
A 30 de Agosto deste ano, o astró-
nomo amador Gennady Borisov
detectou um objecto com a aparência
de um cometa no seu próprio obser-
vatório. Num telescópio também
fabricado por si, viu que esse objecto
tinha uma cabeleira (uma nuvem de
poeira e gás chamada “coma”).
Como astrónomos amadores e pro-
Æssionais continuaram a observar
esse objecto — na altura, designado
C/2019 Q4 (Borisov) —, o Centro de
Planetas Menores da União Astronó-
mica Internacional (IAU, na sigla em
inglês) conseguiu calcular uma órbita
preliminar, que sugeria que esse cor-
po teria vindo de fora do nosso siste-
ma solar. A conÆrmação chegou a 24
de Setembro e a IAU rebaptizou-o
como 2I/Borisov.
Este é assim o segundo objecto
interestelar que conseguimos obser-
var até ao momento. Em 2017, já se
tinha observado o Oumuamua (nome
havaiano para “mensageiro”), um
asteróide interestelar com uma tona-
lidade vermelha escura e extrema-
mente alongado, o que lhe daria a
forma de um charuto.
Ao longo desse tempo, uma equipa
de cientistas da Polónia e da Holanda
analisava as características do 2I/Bori-
sov. Logo depois da detecção do
Oumuamua, esse grupo criou um pro-
grama de computador, o Triturador
Interestelar, que faz uma análise
exaustiva de dados online que indicas-
sem o aparecimento de novos come-
tas e asteróides que se parecessem
com objectos interestelares. A 8 de
Setembro, o programa emitiu então
um “alerta vermelho” de um possível
objecto vindo do espaço interestelar.
Dias depois, a equipa observou o


Cientistas da Polónia e da Holanda Äzeram o primeiro retrato do cometa 2I/Borisov, o segundo objecto


interestelar que detectámos, e revelam que será muito parecido com outros cometas do sistema solar


avermelhada, cauda curta e uma lon-
ga cabeleira, estima-se que o seu
núcleo sólido tenha dois quilómetros
de diâmetro.
De acordo com a equipa, estas
características tornam o 2I/Borisov
muito semelhante aos cometas nati-
vos do nosso sistema solar. “Morfolo-
gicamente, parece um cometa típico
do nosso sistema solar e a sua cor
também é compatível com a que
observamos nos cometas do nosso
sistema”, descreve Piotr Guzik. O
cientista refere ainda que o 2I/Borisov
é maior e mais brilhante do que o
Oumuamua.

OBSERVATÓRIO GEMINI/NSF/AURA

Imagem do cometa interestelar 2I/Borisov obtida em Setembro pelo Telescópio Gemini Norte, no Havai

Quanto à origem do cometa, uma
outra equipa de cientistas da Acade-
mia Polaca de Ciências sugere que terá
vindo de um sistema estelar binário a
13 anos-luz de nós conhecido como
Kruger 60. Até agora, este artigo sobre
a proveniência do 2I/Borisov foi divul-
gado no site arxiv.org (repositório
onde físicos e matemáticos submetem
informalmente os seus resultados ao
escrutínio dos seus pares).

Próximo em Dezembro
“O 2I/Borisov é um pedaço de maté-
ria vinda de outro sistema solar que
fez uma visita ao nosso sistema solar.
Ao investigarmos este objecto, estu-
damos o material que, há algum tem-
po, andou possivelmente a girar à
volta de outra estrela”, frisa Piotr
Guzik sobre a importância da desco-
berta do cometa. O 2I/Borisov e o
Oumuamua conÆrmam ainda algo
que os astrónomos já especulavam
no passado: outros sistemas solares
estariam a ejectar cometas e asterói-
des e esses corpos poderiam estar a
passar, ocasionalmente, pelo nosso
sistema solar.
Mas o 2I/Borisov ainda terá o seu
grande encontro com a Terra. A sua
maior aproximação será a 28 de
Dezembro, quando Æcar a 290
milhões de quilómetros de nós. “Nes-
se encontro, o cometa poderá ser
observado sobretudo por telescópios
proÆssionais, mas mesmo assim
parecerá muito ténue. Poderá ser
detectado por astrofotógrafos ama-
dores, mas não será visível mesmo
em telescópios amadores grandes”,
indica Piotr Guzik.
Na aproximação à Terra, os cientis-
tas esperam descobrir mais porme-
nores sobre este cometa. Neste
momento, está a aproximar-se do Sol,
Æcando a 7 de Dezembro a apenas
cerca de 300 milhões de quilómetros
da nossa estrela, ao que Waclaw
Waniak, também da Universidade
Jaguelónica e autor do trabalho,
salienta: “O cometa ainda está a
sobressair entre o brilho do Sol e a
aumentar o seu próprio brilho. Irá
estar observável por muitos meses, o
que nos faz acreditar que o melhor
ainda está para vir.”

cometa através do Telescópio Gemini
Norte, localizado em Mauna Kea (no
Havai), e do Telescópio William
Herschel, em La Palma (em Espa-
nha). Esta análise mais pormenori-
zada à órbita do 2I/Borisov permitiu
assim conÆrmar a sua origem extra-
solar e descobrir algumas das suas
características.
“O 2I/Borisov é um cometa com
uma órbita altamente hiperbólica, o
que signiÆca que veio do espaço inte-
restelar”, diz ao PÚBLICO Piotr Guzik,
da Universidade Jaguelónica (em Cra-
cóvia, Polónia) e um dos líderes deste
trabalho. Além da sua tonalidade [email protected]

Sistema solar


Teresa Sofia Serafim


A maior


aproximação


do 2I/Borisov


à Terra será a 28 de
Dezembro, quando

Äcar a 290 milhões


de quilómetros


de nós

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