Público - 05.10.2019

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54 • Público • Sábado, 5 de Outubro de 2019


INICIATIVAS


AGENDA


Ano de crise dinástica, 1385 é o ponto
de partida de um volume escrito “a
12 mãos”: uma visão poliédrica essen-
cial para entender este fascinante
período histórico.
Entre os anos de viragem da Histó-
ria de Portugal, 1385 reveste-se de um
carácter especial. “Ano de uma crise
dinástica que poderia ter resultado
na absorção do reino ou, como suce-
deu, numa transição bem-sucedida
(do nosso ponto de vista) para uma
segunda dinastia portuguesa, 1385 foi
encarado como desenlace de uma
‘revolução’ (1383-1385) na qual o
povo, e em particular o povo urbano
de Lisboa, emergiu como actor histó-
rico, sobretudo pela pena genial de
Fernão Lopes. Todavia, de tanto ser
carregado com sentidos políticos e
patrióticos ao longo dos séculos, per-
de-se de 1385 a noção de que a socie-
dade portuguesa de então era radi-
calmente diversa da que viria a for-
mar-se depois, já para não falar da
moderna”, aÆrma Rui Tavares, o
coordenador da colecção Portugal,
Uma Retrospectiva, no âmbito da
qual este volume marca também a
entrada na Idade Média. “É difícil na
nossa consciência colectiva conseguir
identiÆcar a Idade Média por entre a
grande massa de medievalismos, de
imagens mais ou menos fantasiosas,
que sobre esta época a posteridade
foi agregando. A Idade Média é — tal-
vez surpreendentemente para alguns
— um terreno de enorme experimen-
talismo político, social e religioso”,
acrescenta o historiador.
Um ano especial e um volume
igualmente singular exigiram uma
abordagem diferente dos até então
publicados: este volume foi escrito “a
12 mãos”. Trata-se, pois, de uma obra
colaborativa, escrita por vários histo-
riadores, que dão uma visão poliédri-
ca essencial para entender este fasci-
nante período histórico. “Além da
convicção que também em Ciências
Sociais e Humanas é importante o
trabalho em equipa, aqui teve peso o
facto de a universidade portuguesa,
na área da História, como na maior
parte das áreas cientíÆcas, ter conse-
guido atingir um nível de especializa-
ção muito elevado que permite cruzar
análises diversiÆcadas, com metodo-
logias e interrogações próprias sobre
um mesmo problema. Décadas atrás,
seria difícil construir uma visão mais

Um ano de viragem


História


Col. Portugal, Uma Retrospectiva
1385 — vol. 19
Sexta-feira, 11 de Outubro
Por +7,50€

de famílias na Corte, inserção das oli-
garquias municipais nas esferas de
poder; desenvolvimento do ‘diálogo’
em Cortes. Devem salientar-se ainda
os impactos decorrentes de um rela-
cionamento ‘instável’ com Castela, ou
a deÆnitiva assunção da importância
de uma formação graduada no estran-
geiro (leia-se Itália) para a promoção
funcional no seio da administração
superior da Coroa. Por Æm, esta socie-
dade encontra-se no gérmen do que
será uma sociedade quatrocentista
marcada por um expansionismo
decorrente do avanço para sul (terri-
torial, bélico, cultural, etc.); e tenha-
se ainda em conta que com D. Manuel
irão desaparecer as minorias religio-
sas, o que é uma ruptura signiÆcativa
relativamente aos séculos anteriores
— mesmo se, como o volume indica,
quanto aos judeus, o Ænal do século
XIV acuse já o crescer da intolerân-
cia”, explicitam também.
Neste contexto, Maria de Lurdes
Rosa escreve então sobre um reino
em convulsão, um novo rei e uma
batalha decisiva. Judite Freitas dedica-
se às cortes (re)fundadoras de Coim-
bra. Mário Farelo olha para a vida
urbana de Lisboa a partir das suas
procissões. António Castro Henriques
descreve o “Ano Económico”. Saul
António Gomes escreve sobre os
judeus portugueses e, Ænalmente, Iria
Gonçalves reconstitui a vida de uma
camponesa em terras senhoriais a que
deu o nome de Maria Domingues.

“famosa” de natureza política para
olharem para a realidade portuguesa
da altura em múltiplas perspectivas
e temporalidades. “O tipo de análise
histórica que se seguiu levou a que se
considerem elementos de permanên-
cia, como o carácter eminentemente
rural da população portuguesa, a sua
organização social, as suas formas de
rendimento, que passavam pelo tra-
balho dos campos, pela mercancia.
Mas também ao nível das elites que
rodearam o Mestre [de Avis], e que
irão reforçar a sua coesão e inÇuência
ao longo do século XV, foi relevante
uma temporalidade (pelo menos)
média. Foram as Guerras dos Ænais
do século XIV que criaram, a partir
de vários meios sociais, uma aristo-
cracia militar orientada para o serviço
régio; este é o meio de onde vêm
Afonso de Albuquerque, os Almeidas,
Pedro Álvares Cabral, etc., e um ‘Esta-
do’ (e casas senhoriais sustentadas
pelas receitas públicas) capaz de as
sustentar”, contam os referidos inves-
tigadores. “Do ponto de vista econó-
mico (salários reais, rendas), 1290
está mais distante de 1385 do que de


  1. Do ponto de vista demográÆco
    e monetário, 1500 é mais próximo de
    1290 do que 1385. A sociedade ‘1385’
    caracterizou-se em especíÆco pela
    questão central de uma mudança
    dinástica e da legitimação pessoal e
    linhagística de um novo rei, com tudo
    o que tal implicou em termos de alte-
    rações: nobilitações; entradas e saídas


caleidoscópica sobre 1385. E é ela que
faz justiça à ‘viragem’ desse ano, que
foi plena de signiÆcados diversos,
passíveis de serem abordados a partir
de uma documentação também ela
diversiÆcada”, explicam, em entrevis-
ta ao PÚBLICO, os investigadores
Maria de Lurdes Rosa, Mário Farelo e
António Castro Henriques. “A equipa
preferiu uma organização que con-
templasse e expressasse múltiplas
abordagens temático-documentais,
que favorecessem o cruzamento de
factos históricos e conjunturas, com
as mentalidades e com as ‘vozes’ dos
indivíduos”, explicam ainda os auto-
res, que, em conjunto com Iria Gon-
çalves, Judite Freitas e Saul António
Gomes, assinam o volume.
Os seis investigadores tiveram
como ponto de partida uma data

Terça-feira, 8
Colecção Médicos Escritores
4.º volume — A Noite e a
Madrugada
Uma edição fac-similada e
comemorativa do 80.º aniversário
da Ordem dos Médicos,
composta por 14 obras de
médicos escritores que se
destacaram no panorama da
literatura portuguesa. Uma
parceria com a Ordem dos
Médicos e A Bela e o Monstro,
patrocínio da Bial, Ageas, Clínicas
Germano de Sousa, Lexus, ANF e
apoio da RTP.


Quarta-feira, 9
Colecção A Grande Arte no
Cinema
2.º DVD — Botticelli — Inferno
Uma colecção inédita de dez
documentários que o levam numa
viagem imersiva pelos segredos
das maiores obras e artistas de
todos os tempos — de Boticelli a
Raffaello, de Da Vinci a
Michelangelo, passando por
Caravaggio, Tintoretto, Van Gogh.


Sexta-feira, 11
Colecção Portugal, Uma
Retrospectiva
19.º vol. — 1385
Em 25 volumes, Portugal, Uma
Retrospectiva percorre a história
do país... em sentido inverso. Uma
oportunidade única para
conhecer a “história de como
Portugal se formou no mundo, e
do mundo onde se formou
Portugal”. Uma obra com
direcção de Rui Tavares.

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