TRINTA E DOIS
O telefonema de Graça deixou-o desanimado. Por mais que tentasse retomar a sua relação
com Graça de uma forma, digamos, positiva, era evidente que estavam a ir no sentido contrário.
Ela não lhe dava beijos de parabéns nem de espécie nenhuma, recusava-se a sair com ele, mas
saía com um amigo misterioso — e onde é que Graça tinha ido buscar esse tipo, se a vida dela
se resumia a trabalho/casa/casa/trabalho? —, tornara bem claro que não tinha interesse nenhum
em conversar com ele e, para cúmulo, agora pensava que ele lhe queria «roubar» o filho e
ameaçava-o com advogados e tribunais.
«As coisas não estão a correr bem, Zé», murmurou na intimidade do seu carro. «Vamos
embebedar-nos, Zé? Vamos.» Pôs a tocar o CD de Diana Krall ao vivo em Paris e tomou a
direcção das Docas.
Por volta das oito da noite, sentado numa mesa à janela do primeiro andar de um restaurante
vazio, deu um gole no seu Jameson puro com três pedras de gelo e contemplou o movimento
festivo das pessoas que passavam lá fora, entre os bares e as respectivas esplanadas. Dali podia
ver a ponte sobre o Tejo com o seu trânsito perpétuo, o rio e os barcos atracados na marina que
se estendia ao longo da zona dos bares e restaurantes. Pegou no telemóvel e ligou a Sara, num
impulso.
— Ainda te lembras de mim? — perguntou-lhe, mas num tom que ela percebesse que era a
brincar e, de modo algum, uma crítica.
— Lembro — disse ela, contente por ouvir a sua voz.
— Onde é que estás?
— Barcelona.
— Barcelona? A fazer o quê?
— Vim com uns amigos.
— Obrigado por me teres convidado.
— Oh, coitadinho. Tinhas vindo se eu te tivesse convidado?
— Não, não podia.
— Então, estás a ver porque é que eu não te convidei?
— Mas teria gostado que me tivesses convidado na mesma.
— Está bem. Da próxima vez eu convido.
— Combinado. Quando é que voltas?
— Na sexta-feira. Tenho de trabalhar no fim-de-semana.
— Tens?
— Hum, hum.
— Então, quando é que te vejo?
— Na segunda, pode ser?