Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

QUARENTA E QUATRO


Atirou-se ao trabalho para esquecer o resto. Durante uma semana viveu praticamente no
banco, despachando serviço com uma eficiência estonteante. Pressionava toda a gente,
reclamava com os outros sectores, implicava com os seus funcionários e deixou Lisete à beira
de um ataque de nervos.
No sábado foi buscar Quico, mas em vez de o levar a passear, a almoçar ao McDonald’s, ou
ao cinema, enfiou-se com ele no gabinete. No domingo foi a mesma história e, como
ultimamente quase não conseguia dormir, na segunda-feira chegou ao banco antes das sete.
Tó telefonou-lhe a meio da semana:
— Então, pá? — resmungou. — Já te deixei montes de mensagens. Se estás chateado comigo,
podias, ao menos, dizer-mo na cara, ou telefonar ou qualquer coisa.
— Estás parvo? — reclamou Zé. — Não te disse nada porque tenho andado cheio de trabalho.
— Ah, bom. E quando é que podes aparecer para tomarmos um café?
Zé parou um instante a pensar. Depois deu-lhe um vaipe e disse:
— Olha, agora mesmo. Vou aí tomar um café contigo.
E saiu sem dizer nada a ninguém. Passou por Lisete sem reparar nela e deixou algumas
pessoas penduradas à espera de uma reunião, que nem se deu ao trabalho de desmarcar. Para
dizer a verdade, nem se lembrou.
Encontraram-se no café do senhor Abílio, perto do escritório de Tó, e sentaram-se na
esplanada, ao lado um do outro, depois de limparem como puderam a água de uma chuva
recente, que molhara as cadeiras e as mesas.
— Dois cafezinhos, senhor Abílio — pediu Tó.
— Vão já sair.
— E uma imperial — acrescentou Zé.
— Duas — corrigiu Tó.
— Olhe — disse Zé —, esqueça os cafés e traga só as imperiais.
— E tremoços, já agora — acrescentou Tó.
— É para ontem — disse o senhor Abílio.
Zé deixou-se escorregar pela cadeira, confortavelmente. Tó sentou-se direito, com os
cotovelos apoiados na mesa. Parecia um pouco rígido, se bem que Zé nem tivesse dado por
isso. Ele próprio andava aluado de mais para dar conta dos pormenores.
— Há muito tempo que não me sentava calmamente a beber uma imperial — comentou Zé.
— Muito trabalho?
— Nem imaginas.
— Imagino, imagino, que eu também não tenho tido tempo para me coçar.
Vieram as cervejas e os tremoços. Deram um gole e pararam em contemplação, a ver uma

Free download pdf