Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

necessidades básicas do miúdo. Em contrapartida, quando estava com ele, estragava-o com
mimos, sabendo perfeitamente que isso iria deteriorar a relação de Graça com o filho.
Bem vistas as coisas, nos últimos meses Zé revelara-se um idiota machista e fora injusto com
Graça. Machista porque, embora tivesse sido ele a traí-la, não achara concebível que Graça,
enquanto mulher, tivesse o direito de arranjar outra pessoa; injusto, precisamente porque, afinal
de contas, ele era o único culpado por o casamento deles ter acabado. Mas a verdade é que não
lhe interessava para nada se estava a ser machista ou injusto. O que lhe interessava mesmo era
atacar Graça e acusá-la de deslealdade e de ser manipuladora, de ter escolhido o melhor amigo
dele só para o castigar, de não ter princípios nem dignidade para respeitar o homem com quem
ela dormira a maior parte da sua vida. E pronto, isto já o deixava bastante satisfeito.
Enquanto geria esta relação tensa — para não dizer raivosa — com Graça, alimentando-se
unicamente do ódio que sentia por ela, sem analisar muito o motivo que o levava a ser assim, ia
tudo muito bem. Zé não se importava de ser mau, porque ela merecia. Mas a tarde no Jardim
Zoológico com Quico abriu-lhe os olhos e, a partir daí, já não lhe foi possível continuar a ser
mesquinho só porque lhe apetecia. Compreendeu que o rumo que estava a seguir traria
consequências desagradáveis para Graça, mas também para Quico e para ele próprio. E,
portanto, não poderia ir por ali fora sem mudar uma vírgula no seu comportamento, tendo
consciência de que estava errado. Por muito que lhe custasse, teria de fazer sacrifícios se não
quisesse fazer mal ao filho. Quico era o factor mais importante do problema e Zé já não estava
disposto a usar o filho só para satisfazer o seu desejo de vingança em relação a Graça.
Mas uma coisa era Zé chegar à conclusão de que tinha de mudar, e outra, completamente
diferente, era mudar de facto. Zé sabia que não ficaria bonzinho de um dia para o outro.
Bastava-lhe ir a casa de Graça, onde tinham vivido durante dez anos, e aparecer-lhe Tó à porta,
para lhe dar a volta ao estômago e ter logo vontade de começar a embirrar com ela. Contudo,
era um princípio. Prometeu a si próprio fazer os possíveis para engolir o ressentimento e
procurar retomar com ela um relacionamento, no mínimo, civilizado.

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