Sara não disse nada, limitou-se a esperar que ele falasse.
— A primeira coisa que eu quero fazer é pedir-te desculpa pelo que aconteceu na última noite
em que nos vimos. Eu estava perdido de bêbedo, como certamente terás reparado, mas isso não
é desculpa. A verdade é que te humilhei e, se tu não voltares a falar comigo, vou ter de aceitar
isso como um castigo bem merecido. Mas, pelo menos, queria pedir-te desculpa e dizer-te que
estou profundamente arrependido do que fiz.
— Óptimo — disse ela, voltando-se para ele tão zangada como antes. — Estás perdoado. Já
acabaste? Posso ir-me embora?
— Não, ainda não acabei.
— Hoje também andaste a beber? — atirou-lhe. — É por isso que tiveste um ataque de
sentimentalismo e decidiste vir pedir-me desculpa, ao fim deste tempo todo?
— Hoje não bebi — disse Zé, surpreendido com a reacção dela.
— Ai, não? Cheiras a álcool à distância, mas deve ser só impressão minha.
— Bebi só uma cerveja, Sara. Não andei a enfrascar-me. Hoje despedi-me do banco e a
seguir fui às Docas beber uma imperial. Foi só isso. Já não me embebedo desde aquela noite.
— Despediste-te do banco?
— Despedi-me.
— Ah, assim já fico muito mais descansada — ripostou ela, carregadinha de ironia.
— Quando eu te pedi para esperares até sexta-feira para te dar uma resposta sobre se queria
viver contigo — continuou Zé, passando por cima da observação cáustica dela — foi porque ia
jantar com Graça nesse dia e tinha a esperança de que ela me quisesse de volta. Eu não estava a
pensar na tua proposta, estava a ganhar tempo. Mas ela disse-me definitivamente que não queria
mais nada comigo. Então, eu fiquei cheio de pena de mim e fui ter com a Regina a uma discoteca
onde ela trabalha às vezes.
— Tu já a conhecias? — exclamou Sara, cada vez mais indignada.
— Já — admitiu, fazendo que sim com a cabeça.
— Na loja?...
— Eu não sabia que ela trabalhava lá, foi uma coincidência. Fiquei aflito e disfarcei.
— Porquê? Qual era o problema de a conheceres? — perguntou, admirada, mas a resposta
ocorreu-lhe de imediato: — Tu andavas metido com ela?
— Não andava metido com ela. Passei uma noite com ela, mais nada.
— Que vergonha! — exclamou Sara, abismada, tapando a boca com a mão.
Pois é , pensou ele, sem comentários.
— Na altura em que tu me propuseste vivermos juntos — continuou Zé —, eu ainda achava
que gostava da Graça. Achava, mas estava enganado, e, felizmente, ela não me quis de volta. E,
para dizer a verdade, eu não queria viver contigo, porque não confiava muito em ti e não estava
certo de que gostasse de ti o suficiente para dar esse passo.
— Obrigada pela frontalidade — disse ela, desconsolada.
— É essa a ideia, ser frontal, contar-te tudo, não te enganar, percebes?
— Acho que sim.
— Eu dei cabo do meu casamento porque já não gostava da Graça e fui desonesto com ela.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1