Mas podia ter-me separado dela sem ser desonesto e hoje em dia ainda seríamos amigos e eu
teria poupado muito sofrimento. Foi por isso que vim falar contigo, porque percebi que gosto de
ti e não quero que a nossa relação acabe desta forma.
— A nossa relação já acabou, Zé, caso não tenhas reparado.
— Tu disseste-me que aquela tua atitude, de apareceres e desapareceres da minha vida, era
porque tinhas medo de assumir um compromisso, não querias sofrer uma desilusão. E eu vim
dizer-te que me portei como um idiota porque não sabia minimamente o que queria fazer com a
minha vida. Ou melhor, pensava que sabia, mas não sabia. E era por isso que andava meio
desnorteado e só fazia asneiras. Agora já sei exactamente o que quero, e tenho a certeza de que
quero que tu faças parte dela.
Sara manteve-se em silêncio, a olhar em frente. Zé reparou que havia uma lágrima a descer-
lhe pelo rosto.
— Eu contei-te isto tudo — acrescentou — porque quero ser honesto contigo.
— Agora já é tarde para isso, Zé — disse Sara, num murmúrio. Graça havia-lhe dito o
mesmo, naquele jantar, pensou Zé, sentindo, com enorme desânimo, que perdera
irremediavelmente a confiança de Sara.
Ela limpou os olhos marejados de lágrimas com a manga do casaco e depois abriu a porta e
saiu, sem dizer mais nada. Zé ficou a vê-la a atravessar o passeio em direcção à entrada do
prédio e depois baixou a cabeça, apoiando a testa em cima do volante.
Sara parou à porta do seu prédio, com a cabeça num turbilhão de sentimentos desencontrados,
dividida entre o amor por Zé e a indignação que as revelações dele lhe tinham provocado.
Enfiou a chave na fechadura devagarinho, a pensar que, apesar de tudo, ele havia sido honesto
com ela e que, se ela não lhe desse uma segunda oportunidade, talvez nunca mais encontrasse
alguém que amasse tanto como a ele.
Zé sentiu a porta do carro abrir-se de novo e levantou a cabeça, surpreendido por ver que
Sara regressara.
— O que é que aconteceu naquela noite, com a tua amiguinha? — perguntou Sara à queima-
roupa, inclinada para dentro do carro.
— Não aconteceu nada — respondeu Zé, com um sorriso des concertado. — Ela largou-me na
cama, tirou-me os sapatos e foi-se embora.
— Prometes que não voltas a desiludir-me?
— Prometo.
— E queres viver comigo?
— Isso aí — disse Zé, comprometido — é uma coisa que temos de conversar muito bem.
Sara revirou os olhos, exasperada.
— Eu logo vi — disse. Fechou a porta novamente e voltou para casa. Mas desta vez Zé saiu
do carro e foi atrás dela.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1