Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

DEZASSETE


Zé andava febril, totalmente absorvido pelas suas relações conturbadas. Sentia dificuldade em
concentrar-se no trabalho e, numa altura em que mais precisava de se dedicar ao novo cargo no
banco, acontecia precisamente o contrário. Passava muitas horas no gabinete, demasiadas, mas
era como se não estivesse lá. Andava aluado, demorava o dobro do tempo necessário para
despachar os assuntos, deixava passar os prazos, estava a tornar-se desleixado. Começava a
atrair as atenções dos seus superiores e de forma alguma pelas melhores razões.
Graça deixara de ter um lugar prioritário nos seus pensamentos. Havia dias inteiros em que
nem se lembrava dela, a não ser quando chegava a casa. Longe iam os tempos em que Zé lhe
telefonava de manhã e de tarde, em que se falavam só pelo prazer de se ouvirem, mesmo quando
não tinham nada de concreto para dizerem um ao outro. Mas Zé ainda pensava em Graça como a
sua mulher e era assim que tudo deveria permanecer. No seu íntimo, ele queria convencer-se de
que nada mudara, recusava-se a admitir qualquer alteração de sentimentos relativamente a
Graça. Não, ela era a escolhida, a mãe do seu filho, a mulher da sua vida e divórcio era
daquelas palavras que não lhe passavam pela cabeça. Era verdade que a vida se tornara mais
complicada, mas nada mais do que isso. Graça não é para aqui chamada , dizia a si próprio,
para se tranquilizar, se por acaso a recordação dela se intrometia no meio de uma reflexão que
incluía Cátia ou Sara, ou Cátia e Sara.
Cátia mantinha-se inabalável no quadro de honra das suas conquistas, o que tornava muito
difícil a Zé desistir de a ver e de continuar a visitá-la no seu apartamentozinho colorido.
Contudo, aquela sensação de novidade inicial já se dissipara por completo e ele gostaria de se
convencer de que já era altura de cada um seguir o seu caminho pacificamente, sem
ressentimentos. Só que, por alguma razão que tinha que ver com a beleza fascinante de Cátia e
com todas as implicações psicológicas que esse facto trazia, Zé era como um viciado a querer
desistir da droga, mas incapaz de dar o passo decisivo. Ainda pensava que ela era boa de mais
para ser verdade e ainda se sentia deslumbrado na sua presença. Cátia era o seu Ferrari das
mulheres e ele não se sentia capaz de abrir mão dela. Se Cátia fosse um Ferrari a sério e Zé se
fartasse dele, podia vendê-lo e não pensar mais no assunto nem ficar com sentimentos de culpa
em relação a isso, mas Cátia era uma pessoa de carne e osso e, apesar de Zé fazer um enorme
esforço para não levar a sério a relação que existia entre eles, a verdade é que não podia
desfazer-se dela como se fosse apenas um objecto bonito.
No fundo, Zé não era um sacana insensível que se estava nas tintas para os sentimentos de
Cátia. Se era arrogante e a comparava a um Ferrari , se se queria convencer de que ela não tinha
a menor importância para ele, era precisamente por ter medo de se apaixonar por Cátia.
Podia ter um caso inocente com uma mulher, podia ir a casa dela e desfazer o seu cadeirão de
palhinha numa cena de sexo frenética e rebolar com ela pelo chão e essas coisas todas, e até

Free download pdf