seguida, menos ingenuamente, Graça consultou o registo de chamadas efectuadas e, das últimas
dez que o aparelho permitia ver, quatro eram para a tal Cátia e — alarme! — seis referiam-se a
uma Sara, de quem, mais uma vez, Graça nunca ouvira falar.
Voltando a Cátia, a primeira preocupação da lista, Graça não resistiu ao impulso e ligou o
número dela.
— Está?
— Sim, Cátia?
Hesitação.
— Sou...
— Aqui fala a mulher de Zé Figueiredo. Você estava a tentar falar com o meu marido?
— Sim... estava.
— Ah, bom, é que ele agora está a tomar banho e não pode atender. Quer deixar algum
recado?
Nova hesitação.
— Não ehh... deixe lá, não é nada de importante.
Resposta errada, minha linda , pensou Graça.
— Alguma importância deve ter — disse — para você telefonar tantas vezes seguidas...
— Não, é que, era só um assunto de trabalho, mas pode esperar para mais tarde. Eu depois
falo com o doutor Figueiredo, não se incomode.
«Doutor Figueiredo», estás a melhorar. Um toque de cerimónia e distanciamento soa
melhor. Mas quem faz cerimónia não liga fora das horas de expediente por causa de assuntos
sem importância, POIS NÃO?!!!, apeteceu-lhe gritar.
— Veja lá — ironizou, simulando um tom atencioso — se não quer mesmo deixar recado.
— Não, diga só que eu liguei e, olhe, deixe lá, não o incomode mais. Isto pode ficar para
segunda-feira.
— Muito bem. Então, nesse caso, boa noite.
— Boa noite, obrigada, com licença — disse Cátia, um pouco atabalhoadamente, e desligou.
Graça sentiu-se a ferver e nem pensou duas vezes antes de ligar o número seguinte.
— Tá?
— Sim, Sara?
— Sou...
— Aqui fala a mulher de Zé Figueiredo.
— Sim?...
— E estava aqui a pensar com os meus botões, por que razão é que o meu marido fala seis
vezes durante o dia para si e, como não a conheço...
Neste ponto, Graça estava consciente de que se arriscava a fazer figura de parva. A conversa
era embaraçosa e estava a acontecer porque ela não reflectira antes de fazer o telefonema. Pelo
tom da voz, Sara não lhe pareceu minimamente comprometida, de modo que podia ser mesmo
uma relação de trabalho.
— O seu marido sabe que me está a telefonar?
— Não... o meu marido está a tomar banho.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1