Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

VINTE


O jantar correu mal. Pior do que mal, foi um desastre. Tinham escolhido um restaurante
japonês da moda, junto ao rio, e esperava-se que se divertissem a observar o cozinheiro a
preparar a comida com todos os rituais e a beberem saké , ou lá como é que se chamava a
bebida, e a tentarem comer coisas cruas como só os japoneses conseguem. Mas Graça sentia-se
infeliz e confusa, e Zé estava à beira do pânico, embora preferisse simular que se sentia
irritado, por uma questão de estratégia.
Ambos tentaram fingir que não havia problema nenhum para não estragarem a noite aos
amigos, mas a certa altura Graça não aguentou mais, levantou-se precipitadamente da mesa e foi
enfiar-se na casa de banho.
— Zé — perguntou Lili —, o que é que se passa?
— Nada, tivemos uma discussão — respondeu, encolhendo involuntariamente os ombros, o
que o fez parecer culpado. E era, de facto, mas a sua ideia era fazer-se de vítima.
— Eu vou lá ver se ela precisa de alguma coisa. — disse Lili, levantando-se.
Na casa de banho:
— Então, miúda? Estás bem?
— Não — disse Graça, a chorar frente ao espelho. — Estou péssima.
— Graça, anda cá. — Fê-la virar-se para ela e ajudou-a a recompor-se. — Tens os olhos
todos esborratados, rapariga.
— Pois tenho — disse Graça depois de se ver ao espelho. Começou a rir-se e a fungar ao
mesmo tempo. Lili riu-se com ela e passou-lhe uma toalha de papel.
— Então — insistiu —, conta lá...
Entretanto na mesa:
— Não me digas que aconteceu o que eu estou a pensar que aconteceu.
Zé abanou a cabeça, devagar, afirmativamente.
— Eh pá, que grande merda!
— Quer dizer, não aconteceu exactamente o que tu estás a pensar, mas andou lá perto.
— Bonito serviço. — Tó cerrou os olhos e inclinou a cabeça para trás.
— Bonito serviço, bem podes dizê-lo.
— Mas a Graça já sabe da gaja lá do banco?
— Não! Ouve lá, ela não sabe porra nenhuma!
— Ai, não?
— Não. Ela sabe que a gaja do banco existe, mas não sabe que eu a ando a comer.
Na casa de banho:
— Eu acho que o Zé anda metido com uma gaja qualquer lá do banco. — Utilizou a palavra
gaja como se cuspisse o desprezo que sentia.

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