VINTE E DOIS
— Não falo com o meu marido há três dias — declarou Graça.
Estava sentada com Isabel numa esplanada com cadeiras de plástico. Era hora de almoço e,
como habitualmente, as duas amigas foram comer uma sopa e uma sandes ali perto do trabalho,
em Carnaxide, zona industrial nos arredores de Lisboa.
— Eh pá, cheira-me a tempestade — comentou Isabel, lembrando-se imediatamente da
beldade que vira na companhia do marido de Graça, algum tempo antes, no cinema. Isabel não
podia dizer que conhecia Zé ou, pelo menos, que fosse amiga dele. Ao contrário de Graça, com
quem trabalhava, almoçava e, às vezes, saía para um programinha de compras, Isabel só
estivera com Zé esporadicamente. E já lá iam uns anitos, cinco, para ser mais exacta, que elas
trabalhavam juntas.
— E que tempestade, minha amiga — disse Graça, em tom de desabafo.
— O que é que se passa?
— Eu acho que o Zé anda a enganar-me.
— Achas, ou tens a certeza?
— Acho. Mas quero fazer-te uma pergunta e quero que me respondas com toda a sinceridade,
sem me esconderes nada, mesmo que penses que é para me protegeres.
— Se eu puder ajudar...
— Eu acho que podes.
— Então, chuta.
— Lembras-te de me teres dito que tinhas visto um tipo parecido com o Zé no cinema com
uma mulher?
— Lembro.
— Era ele, não era?
— Graça...
— Isabel — insistiu, com a voz tensa. — Era ele?
— Era.
— Eu sabia! Eu sabia!
— Graça, tem calma, eu acho que...
— Porque é que não me disseste?
— Eu tentei avisar-te.
— Não, porque é que não me disseste que era ele?
— Eu não o vi a fazer nada de mal. Achei que não tinha o direito de o comprometer dessa
maneira.
— Isabel, tu és minha amiga, não és amiga dele.
— Eu sei e também pensei nisso. Se eu soubesse que o teu marido te enganava, dizia-te. Mas