Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

eu não sabia e não quis meter-te coisas na cabeça que podiam não ser verdade.
— No cinema com uma gaja boazona, Isabel?
— Pois, tens razão. Mas ele podia ter ido ao cinema com ela e não... e ter ido só ao cinema,
não podia?
— Achas?... — ripostou Graça, com ar de pouca paciência.
Agora que pensava nisso — e que o dizia em voz alta — também lhe parecia de uma
ingenuidade gritante.
— Não — confessou. — Mas, na altura achei.
— E sabes quem era ela?
— Oh, Graça! — protestou. — Como é que queres que saiba quem era ela? Não faço ideia.
— Está bem, pronto. Era loura, morena, baixa, alta, bonita, feia? — recitou.
— Era morena, alta e bonita.
— Bolas, Isabel, podias ser mais suave.
Isabel era roliça, a atirar para o baixo, usava óculos fora de moda, definitivamente
desinteressante do ponto de vista físico, perspicaz, sensata, mas, se uma amiga insistia para que
fosse sincera, não era suave.
— Pediste-me para te dizer a verdade.
— Está bem, pronto. Era morena, alta e bonita.
— Foi o que eu disse.
— Eu sei, estou só a mentalizar-me. Mulher nova, casa nova, filhos novos — disse Graça,
pensativa, a lembrar-se de outra conversa que tinham tido.
— Não achas que estás a exagerar?
— Será que estou?
— Ele pode nem gostar dela, não é?
— Morena, alta e bonita, foi o que tu disseste?
— Foi, Graça, foi, mas isso não é tudo, pois não?
— Olha, para dizer a verdade, estou tão furiosa que começo a não me interessar muito se ele
gosta dela ou se quis só levá-la ao cinema. A minha vontade agora era mudar a fechadura de
casa e pôr-lhe as malas à porta. E, se calhar, é mesmo isso que eu vou fazer.
Graça nunca tinha passado por isto, nunca sentira uma desilusão e uma tristeza tão profundas.
Que se lembrasse, nem mesmo na adolescência, quando as raparigas têm desgostos de amor
quase todas as semanas. Até porque já não era adolescente nenhuma e, na sua idade, uma
infidelidade não se chamava desgosto de amor, chamava-se traição.

Free download pdf