dificuldade.
— Olhe o que você fez à vedação, Pereira — abanou a cabeça exasperado,
como quem diz estes gajos não acertam uma. O soldado olhou para ele,
enrascado.
— Não foi de propósito, meu tenente.
— Oh, não foi de propósito. Então, era preciso despejar um carregador
inteiro só para despachar dois gajos?
O Pereira coçou a testa numa baralhação, empurrando o capacete de
combate para trás com um ar atoleimado.
— Mas eu achei que...
— Qual achou, você não acha nada, sua besta — indignou-se o tenente. —
Desde quando é que você acha alguma coisa? Você não está aqui para achar.
Já viu a merda que dá quando você se põe a achar?! Quero aquela vedação de
pé dentro de vinte minutos.
— Agora é um bocado perigoso, meu tenente — arriscou dizer um dos
outros soldados.
— Mas que porra... — O tenente levantou-se de um salto e começou a
andar para a frente e para trás no espaço exíguo da trincheira, exposto à mira
do inimigo, de mãos na cintura, enquanto falava exaltado. — Cambada de
meninas, com medo de um bando de escarumbas maltrapilhos. Todos
borrados por causa de meia dúzia de pretos descalços. Aqueles turras não
valem nada, perceberam?! São uma cambada de paneleiros que não prestam
nem para limpar o cu às vossas mães! Sargento! — gritou para o outro
extremo da trincheira.
— Sim, meu tenente!
— Cinco minutos de morteirada sem parar. Abane-me aquelas árvores até
limpar a área toda. Não me deixe um macaco em cima do galho!
Nuno surpreendeu-se a olhar para o tenente de boca aberta. O tipo era
mesmo doido, pensou, mas, aparentemente, também um líder incontestado e
adorado pelos seus soldados. O curioso é que pelo menos metade do pelotão
de cinquenta homens que defendia aquela trincheira era negra, mas nenhum
deles pareceu incomodado com as palavras do tenente. Talvez pensassem que
os insultos racistas não se aplicassem a eles, talvez achassem que havia pretos
e pretos, e que, enfim, o tenente odiasse uns e tivesse consideração pelos
outros. Nuno não fazia ideia do que eles pensavam realmente, mas também