— Parece que sim — respondeu Nuno, contrariado. — Infelizmente.
— Queres mais um charro?
— Não, obrigado. É melhor não.
O jovem soldado recolheu a sua espingarda automática, rodou o corpo,
deixou-se deslizar de costas apoiadas na parede até se afundar quase até à
cintura na piscina de água castanha e ficar sentado ao lado de Nuno. Retirou o
capacete da cabeça e pousou-o entre as pernas, a boiar. Retirou um maço de
tabaco entalado na dobra da manga arregaçada.
— Um cigarro? — ofereceu.
— Um cigarro, está bem — aceitou. Acenderam-nos, fumaram.
— Ainda bem que já não chove — comentou o soldado, a observar o céu
para lá do telheiro de zinco.
— Já estou farto desta merda — resmungou Nuno.
— Então eu — lamentou-se o outro — que já estou cá vai fazer um ano.
— O que eu não percebo é porque é que vocês não fazem uma surtida e dão
cabo dos gajos. Não estão em superioridade numérica? Não estão mais bem
equipados?
— Estamos.
— Então, porque é que aturam esta merda?
O soldado encolheu os ombros, deu uma passa no cigarro, soltou o fumo.
— O nosso capitão é que sabe.
— Quer-me parecer que, por vontade do tenente, já tinham corrido aquela
malta a pontapé.
— Pois, mas o nosso capitão diz que estamos em contenção, por causa da
revolução e essa treta toda. Eu cá não percebo nada de política, mas ele diz
que, como nos vamos embora em breve, não se justifica fazermos operações
que põem em risco a nossa vida, e eu estou de acordo. Pá, eu quero lá saber se
os turras ficam com Angola. Eu quero é regressar a casa inteiro e voltar à
minha vidinha.
Nuno abanou a cabeça, a perceber o sentimento do soldado, mas sem
compreender a lógica de se estar ali a ser atacado e não se contra-atacar em
força. Parecia-lhe mais seguro tomar a iniciativa, fazer uma acção ofensiva.
Mas, aparentemente, o nosso capitão não pensava assim.