O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

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Na manhã seguinte, Nuno recebeu um telefonema do senhor Dantas a
mudar de planos. Afinal, disse, iam ao tal encontro antes do almoço, se não
fosse inconveniente. Não era, concordou Nuno, mas quis saber com quem se
iam encontrar afinal. Recebeu uma resposta enigmática. Era uma pessoa,
disse o senhor Dantas, depois ele veria. Nuno percebeu que o outro,
cauteloso, não queria desfazer-lhe a curiosidade pelo telefone. Nesse
momento não se preocupou muito com o mistério. Afinal de contas, os
mistérios eram a coisa mais banal numa Luanda mergulhada em conspirações
e Nuno pensou que se tratava apenas de mais um, provavelmente sem
quaisquer consequências. De qualquer modo, precisava de se encontrar com o
senhor Dantas, pois queria pedir-lhe que lhe procurasse um comprador para o
avião. E, se um homem tão bem relacionado como ele não conseguisse
encontrar um interessado, ninguém conseguiria. Nesse caso, o plano B era
voar para a África do Sul e vender aí o aparelho. Mas Nuno confiava que o
amigo lhe resolveria o assunto.


Encontraram-se na Bicker, uma cervejaria na Baixa, tão antiga quanto
célebre, que Nuno frequentava desde sempre, tal como, imaginava ele, a
maior parte das pessoas que vivia em Luanda e que tinha idade para jogar
uma partida de bilhar e beber umas cervejas. Havia uma pequena esplanada lá
fora, onde Nuno foi dar com o senhor Dantas, sentado a uma mesa na
companhia de um homem que ele nunca vira. Cumprimentou o amigo e
estendeu a mão ao desconhecido, um tipo de cabelo muito curto, rosto vulgar,
camisa de manga curta e calça de fazenda castanha. Um tipo sem história, não
se desse o caso de se encontrar sentado à mesma mesa do senhor Dantas e,
assim sendo, havia que reconsiderar a conclusão apressada e presumir que
alguma história o homem havia de ter. O bom do senhor Dantas podia ser a
simpatia em pessoa, mas não tinha o hábito de se dar com tipos sem interesse,
pelo menos para ele.


O homem estendeu-lhe a mão por sua vez, retribuindo o cumprimento,
embora sem mostrar grande entusiasmo, ou melhor, sem mostrar ponta de
interesse. O seu ar enfastiado parecia querer dizer tenho tanta consideração
por ti como por uma matacanha . Vai-te foder também, pensou Nuno,
sentando-se na única cadeira vaga sem pedir licença a ninguém, enquanto o
senhor Dantas procedia às apresentações, a dizer, o Nuno Chaves é o piloto de
que lhe falei, o melhor que conheço. E, dirigindo-se depois a Nuno, o agente

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