— Duas para já, depois se vê como as coisas correm.
— Quando é a primeira entrega?
— Será informado oportunamente.
— Quando é que precisa de uma resposta minha?
— Agora, de preferência. — Nuno abanou a cabeça.
— Tenho de pensar no assunto — disse.
— Muito bem, mas seja rápido. — Levantou-se. — Senhores... — fez uma
pequena vénia em jeito de despedida, voltou-se, atravessou a estrada, foi-se
embora.
Nuno recostou-se na cadeira a vê-lo afastar-se. Acendeu um cigarro, soltou
o fumo para o ar espesso e quente de um final de manhã em que mal se
respirava.
— Parece-me uma boa proposta — comentou o senhor Dantas, que não
abrira mais a boca, até agora. Também ele observava o agente Cardoso a
chegar ao outro lado da rua, a subir para o lugar do pendura de um jipe militar
descapotável, guiado por um condutor à civil, a arrancar.
— Não sei — disse Nuno, circunspecto. — A proposta é boa, mas não
gosto de me meter nestas coisas de olhos fechados. — O senhor Dantas
alargou o colarinho engravatado, a lutar com o calor.
— O que é que há para saber? O PIM patrocina a operação, é carregar o
avião num lado e descarregá-lo no outro.
Nuno olhou para ele com olhos perscrutadores e cenho franzido. Está a
gozar comigo, não? , queria dizer. O rosto do senhor Dantas desenhou um
sorriso cansado, como que a justificar a leviandade do comentário anterior.
Entrelaçou os dedos das mãos pousadas na mesa, respirou fundo.
— Ah, meu caro Nuno, a nossa vida tem destas coisas. Às vezes temos de
arriscar para ganhar.
Claro , pensou Nuno, não és tu que arriscas. Tu ficas em terra, eu é que
tenho de fazer a entrega. Tu, num dia fazes negócios com os senhores dos
movimentos de libertação, no outro fazes com a secreta militar.
— Arriscar é uma coisa — resmungou —, ser parvo é outra.
— Sim, compreendo as suas reservas — concedeu o outro. — Mas vamos