O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

vagarosamente, fazendo-a senti-lo profundamente, levando-a a deslizar para
um lento e perfeito limbo de prazer, que deu a Regina a sensação de se
prolongar por uma maravilhosa eternidade.


Partilharam um cigarro na cama, transpirados e satisfeitos, tomaram um
duche juntos, vestiram-se, saíram. Vamos aproveitar este sol, disse Nuno.
Regina saltou para cima da mota, agarrada a ele, sem perguntar onde iam.
Dispensaram os capacetes. Sentiam-se felizes e imortais. Ele acelerou na
direcção do rio, percorrendo as avenidas largas de Lisboa, atravessando a
Baixa, seguindo ao longo do rio. Estava um dia bonito de Outono e Regina
deitou a cabeça no ombro de Nuno, deixando-se levar à boleia pela beleza da
Marginal, admirando os reflexos prateados dos raios solares nas águas do
Tejo, que nesse dia corriam tranquilas para o mar.


Tinham acabado de se sentar a uma mesa no restaurante Mónaco, junto à
janela panorâmica sobre o rio. Era um lugar improvável para o encontrar,
demasiado romântico, excessivamente formal, mas, por outro lado, Nuno era
aquele ser imprevisível que vagueava pelo mundo ao sabor de um capricho
atrás de outro. De modo que ali estavam os dois sentados à mesa, Regina
idolatrando-o, caída na reverência de um silêncio apaixonado, Nuno
acendendo um cigarro, pensativo, com os olhos fixos num cargueiro que, ao
longe, navegava sem pressa rumo ao oceano que se abria à sua frente.


— Estou a pensar numa coisa — disse ele, como se se tivesse lembrado
agora do que ia dizer a seguir, inspirando o fumo, sem desviar a atenção da
paisagem.


— Estás? — perguntou Regina, de cotovelo em cima da mesa e a testa
encostada ao punho fechado, olhando-o de lado, com um sorriso feliz. Esticou
a mão esquerda para lhe tocar no braço.


— Hum-hum...
— E em que é que estás a pensar?
— Estou a pensar que quero ir viver para Luanda — anunciou. — Aliás,
não estou a pensar, já decidi, vou mesmo.


A expressão sonhadora de Nuno, seguindo a rota do cargueiro, imaginando-
se a bordo, a caminho de Angola, exerceu em Regina uma impressão tão forte
que nem por um segundo duvidou de que ele estivesse a falar a sério. Regina
ficou sem voz, sem pinga de sangue, sem norte. E agora? , pensou...

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