O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

abandonados. A política oficiosa de Portugal para Angola parecia basear-se na
doutrina do eles que se safem sozinhos, para os brancos, e eles que se matem
uns aos outros, para os negros. Ninguém queria saber. Em Luanda, apenas um
punhado de bravos efectivos do COPLAD, fiéis ao Alto-Comissário, defendia
como podia a vida e os bens dos portugueses.


Os combates ultrapassaram a fronteira dos subúrbios e chegaram a algumas
das avenidas mais populosas da cidade de asfalto. Na Avenida do Brasil e na
dos Combatentes, as principais sedes dos movimentos foram destruídas a tiro
e, com elas, os edifícios onde se situavam, alguns com dezenas de
apartamentos, trespassados por balas perdidas, por tiroteios negligentes. Por
esses dias, valia tudo para eliminar o inimigo. O último grito em armamento
eram os canhões sem recuo contra viaturas blindadas. Os guerrilheiros,
sempre imaginativos em assuntos bélicos, deram uma nova utilidade a esta
arma, usando o seu poder de fogo para demolir literalmente as sedes políticas
dos movimentos rivais. Os estragos eram astronómicos e punham em perigo
milhares de civis.


Na população branca dissolveu-se de vez a ilusão de que seria possível ter
um lugar no futuro de Angola. A batalha de Luanda não se cingiu à capital.
Chegado àquele momento decisivo, o país inteiro entrou finalmente na guerra
declarada, numa eclosão de violência que norteava os três movimentos no
sentido de cimentarem as suas zonas de influência exclusiva. Em
contrapartida, os últimos portugueses no Interior puseram-se a caminho da
capital, atravessaram perigosas estradas onde pululavam guerrilheiros capazes
de tudo e correram em peso para a ponte aérea, desesperados por fugir
daquele inferno.


Ao fim de três semanas de combates arrasadores, de apelos à paz na
Emissora Oficial, de inúteis reuniões da Comissão Nacional de Defesa a que o
MPLA não comparecia, este movimento venceu a batalha de Luanda,
expulsando a FNLA e a UNITA da capital. Doravante, a soberania da cidade
seria apenas partilhada pelo poder oficial português e pelo poder de facto das
FAPLA, o exército do MPLA. O crepitar da metralha, as explosões das
granadas de morteiro, de lança-foguetes, os estrondos avassaladores dos
canhões sem recuo foram baixando lentamente de intensidade. A batalha
resumira-se ao duelo entre o MPLA e a FNLA, enquanto os soldados e os
militantes da UNITA, sem armas para retaliar, se tinham resignado a fugir, os
que puderam, e a serem massacrados, os que não conseguiram escapar a

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