O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

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Nuno acelerou por uma rua vazia, paralela à pista principal do aeroporto, ao
longo das traseiras dos hangares, quando viu os primeiros clarões de um
grande incêndio iluminando a noite no lado oposto àquele em que se
encontrava. Alarmado, cortou à direita e atravessou por entre dois hangares
até desembocar na pista. Antes de lá chegar, viu passar ao fundo, de relance,
um carro de bombeiros com as luzes azuis de emergência. Chegou à pista,
virou à esquerda e descobriu ao longe o seu avião em chamas. Nuno acelerou,
sem pensar, como se ainda houvesse alguma coisa a fazer. Mas o Dornier
explodiu logo de seguida, antes de ele ou o carro de bombeiros se acercarem
do local onde se encontrava a arder. Foi uma explosão seca, muito potente,
que fez o avião erguer-se ligeiramente no ar e cair depois pesadamente no
chão, envolto em chamas. Num gesto instintivo, Nuno soltou o acelerador e
travou a moto a fundo, levando a roda de trás a derrapar para a direita e para a
frente. A moto deu de rabo e imobilizou-se voltada de lado para a cena.


Estupefacto, Nuno ficou ali a ver os bombeiros saltarem do carro,
desenrolarem a mangueira e começarem a despejar água sobre o aparelho em
chamas. Só então tomou consciência da gravidade daquele incêndio. E, nesse
momento, o avião destruído com a carga secreta incluída não foi, de todo, a
maior das suas preocupações. O Dornier tinha sido boicotado, obviamente, o
que o levava a pensar que havia irritado algumas pessoas suficientemente
poderosas para fazerem uma fogueira com o seu estimado DO-27. Ora, numa
cidade onde se matava por dá cá aquela palha, não era nada saudável
incomodar esse tipo de gente. Digamos que, naquela altura em Luanda, não se
podia considerar uma atitude muito sensata entrar em guerras que não se
podiam ganhar. Nuno tinha sido avisado para desistir de abastecer a UNITA
com armas e, mesmo assim, não desistira. Agora o seu avião ardia na pista,
estava acabado, e, provavelmente, ele também. Assustado, decidiu sair dali o
mais depressa possível. Deu a volta e fez voar a moto em sentido contrário,
pelo caminho que acabara de percorrer. Precisava de encontrar o senhor
Dantas, pensou, acelerando a uma velocidade vertiginosa por entre os
hangares, e precisava de o encontrar com urgência. E também precisava de
um plano de fuga, pois já não estava seguro em Luanda.


O   senhor  Dantas  atendeu o   telefone    ao  primeiro    toque.
— Oh, homem! — exclamou. — Você está bem?
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