frequentava aos fins-de-semana. Nuno comprou um barco de recreio, uma
lancha fora de bordo em segunda mão, que pagou com dinheiro vivo. Depois
alugaram o apartamento. Em seguida, Nuno comprou uma moto porque disse
que não havia pachorra para andar por aí de táxi e muito menos a cozer como
um ovo e a gramar o cheiro a catinga que impestava os machimbombos . E
com isto Regina começou a achar que as suas férias em Luanda estavam a
ganhar contornos mais permanentes, e começou a pensar que Nuno falava a
sério quando lhe disse que tencionava ir viver para Luanda. Na altura, Regina
sentira-se excluída, e até ofendida com a forma como ele colocara a questão.
Nuno dissera: estou a pensar que quero ir viver para Luanda, como quem
comunica uma decisão unilateral. Não dissera, o que é que tu achas de irmos
viver para Luanda?, ou algo do género. E, perante tamanha insensibilidade,
Regina sentiu-se atrapalhada, sem saber como reagir, entre a vontade de lhe
atirar à cara, numa fúria, então e eu, meu grande cabrão? e o pânico de lhe
ouvir um tu, vai à merda da tua vida, não me chateies. Mas, com o evoluir da
conversa, percebera que Nuno não pretendia descartá-la, simplesmente era a
sua maneira de apresentar o assunto, porque daí a pouco já estava a falar na
primeira pessoa do plural, dizendo todo entusiasmado que podíamos apanhar
um avião já amanhã, o primeiro que sair para Luanda. Afinal de contas, o que
é que nos prende aqui? O que é que temos em Lisboa que não possamos
deixar de um momento para o outro? E Regina, com a alma aliviada e o ego
cheio por se sentir apreciada, nem pensou duas vezes.
— Sim, de facto, posso despedir-me da loja amanhã, fazer as contas e
partir, porque não? — disse, adoptando uma descontracção calculada, para
que ele não pensasse que era alguma adolescente excitada, desejosa de o
seguir incondicionalmente para qualquer parte do mundo, que era
exactamente como ela se sentia naquele momento. Nuno desenhou aquele seu
sorriso sacana, de quem está a perceber tudo mas não diz nada.
— Faz isso — encorajou-a. — Despede-te, larga a porcaria da loja. Não
vejo a hora de sair daqui para fora, deixar este atraso de vida e ir para uma
terra onde haja oportunidades a sério, onde não haja a mentalidade tacanha
desta parvónia.
Este comentário de Nuno constituiu uma autêntica revelação para Regina.
Nunca lhe tinha ouvido uma queixa, nunca havia dado qualquer sinal de não
gostar da vida que levava em Lisboa. Antes pelo contrário, Nuno parecia
bastante feliz, diria mesmo, negligentemente acomodado a uma existência
despreocupada, sem qualquer tipo de angústias existenciais. Pelos vistos,
estava enganada.