O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

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Laurinda conseguiu a boleia de Regina mais cedo do que imaginara.
Bastou-lhe um telefonema e já está, a tua amiga tem de estar no aeroporto
hoje à noite, às dez.


— Não há problema, ela estará lá. E obrigado, meu querido, estás a salvar
uma vida. — Desligou o telefone, em cima do balcão do café, virou-se para
Regina. — Tens a tua boleia, esta noite, às dez.


— Esta noite?!
— Não era o que querias?
— Podes crer que era. Mas, bolas, não estava à espera de que fosse hoje.
— Queres que telefone a marcar para outro dia? — perguntou Laurinda,
fazendo menção de pegar no auscultador.


— Não! Nem pensar. Eu vou hoje.
Regina foi a correr para casa, fazer a mala com a ajuda de Laurinda e,
enquanto juntava em cima da cama o essencial para alguns dias, sentiu um
novo alento. Ter conseguido a boleia com tanta facilidade pareceu-lhe um
bom presságio. Talvez não passasse de uma ilusão, de um optimismo
injustificado, mas o facto de não se limitar a ficar à espera, numa angústia,
sem poder fazer nada, mitigava-lhe a sensação de impotência. Ia correr tudo
bem, acreditou, já estava a correr bem!


— Luanda não é assim tão grande — comentou Regina, a dobrar uma T-
shirt
com três gestos desenvencilhados. — Não há assim tantos lugares onde
o Nuno se possa esconder. Se ele estiver lá, eu encontro-o.


— Também acho — concordou Laurinda, a pensar quem me dera ter o teu
optimismo
, mas sem se atrever a desmoralizá-la. — Já falaste com os teus pais
sobre isto? — Sim, disse Regina, já tinha falado.


— A minha mãe passou-se. Deve achar que sou uma suicida, ou qualquer
coisa do género.


— E o teu pai?
O pai, mais uma vez, revelara-se uma boa surpresa. Tinha dado uma
palmada na mesa, provocando um pequeno terramoto na loiça do final do
jantar, e interrompera as lamúrias da mãe com uma frase agastada: A Regina
não é uma criança, a tua filha sabe o que faz e tu não estás a ajudar nada com

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