O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

dinheiro. Ganhava mais do que alguma vez imaginara e, como era só ele,
podia dar-se a luxos. Com efeito, gostava de motos, de roupa de marca, de
restaurantes caros, boa comida e boa bebida. No que dizia respeito aos
prazeres mundanos, não se moderava. Bem pelo contrário, sentia uma
necessidade, uma sofreguidão de desfrutar ao máximo tudo o que a vida lhe
negara e que agora, subitamente, estava ao seu alcance. Entrou numa espiral
desbragada, numa vida sem regras, sem disciplina, sem horários. Saía todas as
noites, bebia demais, deitava-se de madrugada, as mais das vezes com
mulheres a quem não chegava a saber o nome ou, se sabia, esquecia depressa.
Entregou-se a uma rotina dissoluta, quiçá, iludido pela percepção de que o
divertimento e a felicidade eram uma e a mesma coisa.


Era jovem, confiante, achava-se imbatível e despediu-se para trabalhar por
conta própria. Depois surgiu-lhe o negócio da droga e em breve Nuno já nem
se dava ao trabalho de vender carros. Progressivamente, foi deixando de
procurar clientes, de manter vivos os contactos que lhe garantiam a
actividade. A vida nocturna era bastante mais excitante e igualmente
recompensadora. Na realidade, deixou de ter uma profissão e, se continuava a
intitular-se negociante de automóveis e se ainda fazia um ou outro negócio
ocasional, era porque tinha necessidade de manter uma fachada de
respeitabilidade.


Embora não pudesse, honestamente, dizer que resistira com muita
convicção às ameaças do seu fornecedor para que continuasse a vender LSD
aos tipos ricos da alta sociedade, Nuno sentia-se dividido entre a ganância e o
ressentimento. Queria ganhar dinheiro mas não gostava de ser ameaçado e a
relação com o fornecedor começava a tornar-se demasiado complicada. O
homem pressionava-o para vender mais, como se Nuno pudesse inundar a
cidade com o produto dele e, qual pastor de uma seita psicadélica, tivesse o
poder de fazer embarcar os seus discípulos em alucinações colectivas. Sabia
que era perigoso vender grandes quantidades, pois ficaria mais exposto e
aumentava as probabilidades de ser apanhado. Não queria ser preso, ser
tratado como um criminoso, ficar com cadastro policial. Seria meio caminho
andado para arruinar a sua vida, para se atolar num pântano donde não
poderia sair nunca mais. Depois de passar uma temporada numa prisão quem
é que lhe daria emprego? Quem confiaria nele? Não conseguiria voltar ao
negócio dos automóveis, suspeitava que nem um carrinho de linhas lhe
comprariam. As portas fechar-se-iam definitivamente e estaria condenado a
sobreviver de esquemas ilegais. Seria, enfim, oficialmente um criminoso.


Este pensamento, aliado à persistência do fornecedor, assustou-o. Nuno
percebia que estava a ganhar fama de dealer entre a alta sociedade e a

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