17
Cinco anos antes — numa outra vida — em Lisboa, Nuno desafiara o
perigo com a mesma coragem, a mesma vontade imparável de levar a água ao
seu moinho, nem que para isso tivesse de correr riscos muito para além do
razoável. O tudo ou nada começava a tornar-se o seu lema.
Foi ao encontro do fornecedor na Praça do Rossio. A Baixa pareceu-lhe
uma zona suficientemente movimentada para servir os seus propósitos. O
homem esperava-o em frente ao monumental teatro nacional D. Maria II, o
edifício neoclássico que ocupava o topo norte da praça. Nuno foi dar com ele
no outro lado da estrada, sentado no rebordo de pedra da fonte redonda, no
passeio central. Foi fácil encontrá-lo, pois vestia o eterno fato castanho
amarrotado que já levara Nuno a pensar que talvez não tivesse outro. De
qualquer modo, ele não se lembrava de o ter visto com outra roupa e, quando
pensava no fornecedor, era exactamente assim que o recordava. Fumava um
cigarro e tinha a seus pés um daqueles sacos de pele falsa oferecido pela
companhia aérea nacional, de formato cilíndrico, branco, com as letras da
TAP a vermelho, tal como as pegas.
Nuno aproximou-se do fornecedor. Cumprimentaram-se com um resmungo.
Colocou um pé em cima do rebordo da fonte, uma bota de cano alto em
cabedal, enfiou a mão dentro do blusão, também de cabedal, tirou o maço de
tabaco do bolso da camisa, acendeu o cigarro com um Zippo cromado, apoiou
o antebraço esquerdo na perna e assim ficou, a fumar, ligeiramente dobrado
para a frente, a observar o lado leste da praça, enquanto que, virado ao
contrário, o fornecedor via o lado oeste.
— Onde está o homem? — perguntou este último.
— No café — respondeu Nuno, fazendo um gesto por cima do ombro,
como se pedisse boleia a alguém, indicando com o polegar o estabelecimento
no outro lado da rua, mesmo à frente dos olhos do fornecedor.
— Então, vamos lá.
— Não.
— Não?
— Não vamos lá — corrigiu. — Eu vou lá.
— Ai, o caralho...
Nuno desviou os olhos dos belos edifícios pombalinos e concentrou-se no