O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

fornecedor que insistia em agir como se fosse seu dono. A solução era usar o
playboy caprichoso que queria empoar os narizes dos amigos com uma
novidade de dar a volta à cabeça. O dinheiro era o princípio e o fim daquela
história perigosa, a que Nuno acrescentava um toque de tragédia romântica ao
incluir na sua trapalhada uma mulher inocente que ingenuamente entregava o
destino nas mãos dele.


Naquele dia Nuno estava decidido a acabar tudo com Regina. Acordaram
juntos na cama dele, Nuno levantou-se, foi subir o estore da janela e quedou-
se ali uns segundos a observar o movimento na avenida com uma expressão
desolada, de costas para Regina. É hoje , pensou, respirou fundo, disfarçou o
desalento, voltou para a cama e fez amor com ela.


Mais tarde levou-a ao restaurante Mónaco. Pareceu-lhe um lugar apropriado
para se despedir de Regina, bonito, romântico, porra, sabia lá onde estava
com a cabeça quando o escolheu. Agora já não o achava assim tão apropriado.
Quem é que, perguntou-se, no seu perfeito juízo, faz amor com uma mulher,
leva-a ao lugar mais romântico das redondezas, daqueles onde se vai para
pedir a namorada em casamento, senta-se com ela ao lado de uma janela
panorâmica com vista para o rio prateado sob um sol inspirador e, nesse
ambiente de terna, lânguida e prometedora felicidade, deixa cair a bomba?!
Era uma maldade, ou, no mínimo, uma estupidez.


Nuno quis fazer o mais acertado, podia garantir que sim, só que não
conseguiu. Ali estava ele, a fumar um cigarro com os olhos a acompanharem
o cargueiro que deslizava no Tejo, não porque a imagem do barco lhe
estimulasse a imaginação — como Regina erradamente interpretou — mas
por não ter coragem de a olhar de frente enquanto lhe dizia o que tinha a
dizer. Pelo canto do olho pressentia-a contempladora, feliz, apaixonada.


«Estou a pensar que quero ir viver para Luanda», lá acabou por
desembuchar, «aliás, não estou a pensar, já decidi, vou mesmo». E pronto, foi
tudo, o resto não lhe saiu, não lhe disse que chegara o momento de se
despedirem e de cada um seguir o seu caminho, o que, no seu caso, levá-lo-ia
por um campo de minas nada recomendável. Em vez disso, Nuno viu-se a
encorajá-la a despedir-se do emprego e a partir com ele, como se a proposta
estivesse isenta de perigos, como se assim não a colocasse numa posição
difícil. Na melhor das hipóteses, Nuno iria ter à perna uns tipos muito, mas
mesmo muito pouco amigáveis, cheios de vontade de o comer vivo. Portanto,
porquê contar isto a Regina? Não era nada de mais, pois não?... Claro que
era, mas o problema é que, se lhe contasse, ela já não quereria partir com ele.

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