O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

para a rua a rir-se sozinho com aquilo tudo. Acabara de vender quinhentos
gramas de coca a um tipo que nem sequer abrira o raio do saco para confirmar
que não estava vazio. A sorte dele, pensou, enquanto punha a moto a
trabalhar, é que eu sou um gajo honesto. Engrenou a primeira, olhou por cima
do ombro, não vinha ninguém, rodou o punho do acelerador e voou dali para
fora.


No topo da escada, o fornecedor começou a sentir-se nervoso. Já ia no
segundo copo, na segunda música, e nem sombra de Nuno. Desceu os
degraus, embrenhou-se na confusão, uma volta rápida, a ver se vejo o cabrão,
avançou aos ziguezagues pela multidão. Assim como foi assim voltou,
vasculhou os cantos do jardim e nada. Dirigiu-se para o interior da casa e, ao
entrar na sala, surpreendeu um grupo de amigos a fazer linhas de pó branco
com cartas de jogar, em cima do vidro de uma mesa de apoio. Enrolavam
notas e enfiavam-nas pelas narinas adentro, a snifar coca, a banquetear-se
com a minha coca!
O fornecedor perdeu as estribeiras, aproximou-se com
passadas largas, apoiou a sola do sapato na borda da mesa e empurrou-a
violentamente contra os jovens debruçados sobre ela. Eles protestaram, qual é
a tua, meu?!


— Quem é o dono da casa? — A pergunta soou fria e cortante como o aço
da navalha que o fornecedor trazia dentro do bolso e que estava disposto a
sacar e a encostar ao pescoço do primeiro que se atrevesse a fazer-lhe frente.

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