O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

queria matar e tive de me ir embora? E andar à pancada com um mafioso de
navalha em punho também não iria contribuir para um bom ambiente entre
eles, pois não? Pois não... porra, porra, porra... Nuno começou a perder a
serenidade, incomodado com a situação, irritado por se esconder, sentindo-se
cobarde, tudo aquilo pisando-lhe a dignidade, tentando-lhe a coragem,
passando-lhe agora pela cabeça que, se o fornecedor esperasse pela partida do
avião, ficaria intrigado quando reparasse que Regina não embarcara. Um mais
um são dois, ele baldou-se e ela não embarcou, vou segui-la
, imaginou-o a
pensar, vendo o seu campo de manobra a estreitar-se, conduzindo-o para a
indesejável confrontação.


O fornecedor não se moveu do seu lugar, apenas rodou nos calcanhares,
varrendo o terminal com olhos assassinos, esquadrinhando-o de lés a lés,
aguardando pacientemente que Nuno fizesse um movimento, convencido de
que ele estaria ali algures, escondido. Em contrapartida, Nuno perguntava-se
até que ponto iria a determinação do outro, se teria a desfaçatez de o atacar
em público. Que diabo, o homem trazia na mão um saco cheio de droga, uma
navalha no bolso, havia dois polícias à vista, o que é que ele podia... teve um
sorriso de triunfo. Sem mais hesitações, saltou de trás do quiosque, foi direito
aos agentes que se aproximavam, apontou-lhes o fornecedor, avisou-os de que
o homem acabara de o abordar com uma proposta infame, queria vender-me
droga, inventou, abriu o saco para me mostrar. Tem o saco cheio! Venha
connosco, ordenou um dos agentes. O fornecedor voltou-se, viu-o a falar com
os polícias. Com certeza, estava a dizer, vou só ali buscar a minha mala. O
fornecedor começou a andar em direcção à saída. Os polícias seguiram-no.
Nuno afastou-se. O outro estugou o passo. Os agentes gritaram a mandá-lo
parar. Ele correu, eles correram em sua perseguição, saíram os três do
terminal. Os polícias caíram em cima dele, derrubaram-no, algemaram-lhe as
mãos atrás das costas. Nuno vinha com a mala, acenou a Regina, ela ergueu-
se, apreensiva.


—   Viste   aquilo? —   comentou.
— Vi.
— Seria um ladrão?
Nuno enrugou a testa, numa expressão de dúvida, encolheu os ombros.
— Talvez, não sei — disse, sem dar muita importância ao incidente.
— Que rebuliço — reclamou ela. — E tu atrasado.
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