Um Homem Escandaloso

(Carla ScalaEjcveS) #1

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Cristiane despediu-se de João Pedro à porta de casa.
— Estou muito cansada e tu estás muito bêbado — disse, apanhando-o de surpresa.
— Muito, não! — reclamou ele. Tinha um sorriso ébrio e alguma dificuldade em manter-se quieto
em cima das pernas.
— Pois não — disse ela, com uma amarga ironia.
— Não queres ficar comigo?
— Hoje não. Estou cansada, já te disse.


«Ups, ela está chateada por causa da Carol», disse João Pedro, a falar sozinho quando entrou em
casa e fechou a porta. Mas estava, realmente, demasiado bêbado para se preocupar. Subiu a escada,
entrou no quarto, caiu na cama, adormeceu de imediato sem se despir ou tirar os sapatos.
Já Cristiane, entrou na sala e contemplou desolada a sua cama de bambu abandonada no meio do
espaço vazio. Mantivera-a ali depois de voltar do Brasil porque era preciso desmontá-la, levá-la
para o quarto e voltar a montá-la, e como passara muitos momentos deliciosos naquele cenário
inusitado, não teve vontade de mudar nada imediatamente. Mas agora parecia-lhe tudo um disparate e
a visão da cama desamparada no meio da sala exacerbou ainda mais a sua irritação.
Ao invés de João Pedro, a noite não lhe correra bem e não conseguia dormir porque se sentia
traída e demasiado perturbada para se ir deitar em paz. Imaginara que a noite acabasse de maneira
diferente. Nos seus pensamentos secretos, fizera planos para um dia memorável. Comprara um
vestido lindíssimo e passara a tarde no cabeleireiro a cortar o cabelo e a arranjar as unhas. O
resultado fora bastante satisfatório e... não, porquê ser modesta? O resultado fora fabuloso, de tirar o
fôlego, bolas, hoje estava mais bonita do que nunca, era a mais bonita da inauguração, muitos furos
acima de qualquer Carol! Se João Pedro não via isso não tinha olhos na cara, porque os outros
homens viram e reconheceram.


Cristiane sentou-se na borda da cama a reflectir. Ocorreu-lhe que o interesse de João Pedro por ela
talvez se tivesse desvanecido um pouco com a sensação de conquista consumada, que ele só tivesse
tido olhos para ela até conseguir levá-la para a cama. Assim sendo, Carol seria o seu próximo
desafio. Os homens eram assim, pensou, predadores por natureza. Dava-lhe asco pensar que pudesse
ter sido apenas objecto de divertimento para João Pedro, que ele a visse só como uma mulher bonita
para o quadro de honra das suas conquistas.
Ela, que nem era dada a grandes romantismos, pensara que, para o dia ser perfeito, acabariam a
dormir ali na sala, uma última noite no cenário onde tinham sido cúmplices de um projecto só deles.
De manhã, voltariam a levar a cama para o quarto. Suspirou e deixou cair as mãos no colo, sentindo-
se derrotada.

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