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Deu uma espreitadela rápida pelo óculo da porta, fez uma careta de escândalo, abriu.
— Olá — disse Cristiane.
João Pedro esboçou um sorriso ébrio.
— Olááá, estás boa? — a voz saiu-lhe excessivamente animada. Cristiane desconfiou que acertara
em cheio.
— Estás ocupado?
— Eu? Não, não.
— Posso entrar?
— Claro, entra.
Ela entrou na sala à frente dele, viu Carol sentada à mesa, voltou-se para trás, abriu a boca e os
olhos, pasmada, recompôs-se muito depressa, virou-se outra vez para a frente e cumprimentou
Carol.
— Olá, não venho interromper nada?
Disseram logo que não, que disparate, era muito bem-vinda, tinham acabado de jantar um empadão
delicioso. Carol estava espantada com os dotes culinários de João Pedro. Não sabia. Queria ela
comer também? Ainda havia muito.
— Não, obrigada, já comi em casa, mas não digo que não a um copo de vinho — apontou para a
garrafa em cima da mesa.
João Pedro foi à cozinha, trouxe-lhe um copo, Carol serviu-a, Cristiane bebeu logo metade.
— Pelo que vejo, já vão muito adiantados. Tenho muito que pedalar para vos apanhar — disse, em
jeito de justificação.
Riram-se.
— Já é a terceira garrafa — disse Carol.
— Ui! Dá cá mais um bocado disso.
Seria de esperar que se instalasse uma tensão na sala, os três juntos, cada um com a sua ideia,
embatucados num silêncio, sem acharem nada que dizer, impedidos pelo embaraço. Mas não, o que
aconteceu foi que o vinho lhes soltou a língua e dali a pouco já riam à gargalhada. Só diziam
disparates, João Pedro estava impagável, a falar do seu marchand , a imitar-lhe os trejeitos
efeminados. Carol rebolava a rir; Cristiane enrolava charros que acendia e fazia rodar.
Passaram para os sofás da sala, sentaram-se meio deitados, João Pedro, aluado, com uma delas à
direita e a outra à esquerda, abraçava-as e pensava no seu sonho; Carol puxava o fumo do charro
entre o indicador e o polegar e jurava que depois daquilo só poderia ir arrumar carros: «destroce,
destroce», gozava ela. Cristiane tinha um risinho tolo e enfiava a mão dentro da camisa de João
Pedro, afagando-lhe o peito. Escutavam música de Ibiza.