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De manhã, Cristiane abriu os olhos e viu o belíssimo corpo nu de Carol. Ela dormia ainda, deitada
de lado, de costas para Cristiane que também estava nua. Cerrou os olhos um instante a imaginar a
asneira que fizera na noite anterior. Mas a sua mente era um buraco negro e tinha dificuldade em
pensar. Lembrou-se vagamente de ter saído de casa de João Pedro com Carol, de a trazer para sua
casa. Tinham subido ao quarto... riam-se da cara desesperada dele... despiram-se uma à outra,
entraram na cama, abraçaram-se, beijaram-se devagar. Tinha ideia de ter percorrido largamente o
corpo de Carol com as mãos, de se sentir extasiada ao contemplá-la nua, em pensar como ela era
extraordinariamente bonita, mas não se lembrava do que acontecera a seguir.
Sentou-se na cama, perplexa, a perguntar-se o que mais teriam feito, até onde teriam ido. Não
conseguiu recordar-se de mais nada. A cabeça latejava-lhe, tinha a boca seca, um gosto azedo, um
enjoo que não a deixava raciocinar. Sentiu vergonha, um terrível embaraço, teve necessidade de sair
do quarto, parecia-lhe inconcebível estar ali quando Carol acordasse, não saberia o que lhe dizer,
nem sequer como encará-la.
Deslizou da cama com muito cuidado para não despertar Carol, apanhou do chão a roupa da
véspera, saiu nua do quarto, desceu a escada descalça. Evitou fazer barulho, vestiu-se na sala,
escreveu um bilhete apressado, um desagravo de simpatia: «Tive de sair. Fica à vontade, o tempo
que quiseres, mas não esperes por mim que volto tarde.» Assinou simplesmente o seu nome, sem
beijos, sem palavras que pudessem ter interpretações equívocas. Deixou o bilhete à vista na cómoda
da entrada, saiu.
Foi a última vez que a viu.
Se havia algo que Cristiane tinha em comum com Carol era o espírito irrequieto, a incapacidade de
se resignar e a necessidade de tomar a iniciativa quando as coisas estavam demasiado paradas para o
seu gosto. Cristiane, como Carol, era extrovertida e desembaraçada, mas com a vantagem de ser mais
rápida a pensar. O que as distinguia é que Carol trabalhara muito, com persistência, durante anos,
para chegar onde estava, enquanto Cristiane nunca se preocupara em fazer carreira e não adquirira os
mesmos princípios batalhadores porque se habituara desde menina a que tudo lhe viesse parar às
mãos sem esforço. A primeira era metódica, a segunda intuitiva.
A beleza de Cristiane podia eclipsar Carol, bem como a inteligência fina, a educação e a cultura
superiores. Carol vinha de uma aldeia no interior do país, Cristiane vinha do resto do mundo. Ainda
assim, Carol conseguia ser emocionalmente mais equilibrada e ter o raciocínio frio e objectivo que
faltava a Cristiane.
Na noite anterior, Cristiane não ficara realmente surpreendida por ver Carol a jantar em casa de
João Pedro. A sua reacção ao entrar na sala — voltar-se para ele e abrir a boca e os olhos de