Um Homem Escandaloso

(Carla ScalaEjcveS) #1

as cuecas com uma habilidade improvável, desapertando as suas calças, a subir para a mesa larga
que lhes servia de leito improvisado na urgência que os seus corpos reclamavam. Já tinham esperado
tanto tempo para se terem que, quando Clara o sentiu invadi-la e aquela descarga de prazer tomou
conta dela, agarrou-se a ele sem mais reservas mentais. A cada investida dele, a mesa embatia na
parede numa cadência dura, a madeira rangia violentamente e, a um canto da secretária, o pequeno e
frágil candeeiro equilibrava-se à beira do abismo, até cair ao chão num último estrondo, naquele
instante feliz em que, abandonando-se num espasmo de prazer, Clara soltou bem alto o derradeiro
gemido de realização, sem se aperceber de que cravava fundo as unhas nas costas do patrão.


Escorregaram da mesa, lentamente, observando o estado caótico do gabinete em seu redor. Eles
próprios não estavam melhor, meio despidos, enredados na desordem de roupa amarrotada. Houve
um pequeno instante contemplativo, silencioso, de algum embaraço, mas logo o ultrapassaram através
de uma gargalhada espontânea, sonora e bem-disposta. Clara puxou a saia para baixo e descobriu no
chão o sutiã, as cuecas, a camisa, que ele lhe havia despido por artes mágicas de amante experiente.
Abanou a cabeça, a rir-se, espantada por só agora realizar como ele fora habilidoso, deixando-a
praticamente nua. A sua impressão é que ele a hipnotizara, pois estivera tão concentrada nos seus
olhos intensos que nem reparara no que as mãos faziam mais abaixo. Apanhou tudo do chão e foi para
a casa de banho, levando a trouxa de roupa nos braços. Fechou a porta e viu, reflectida no espelho, a
sua imagem um pouco chocante, nua da cintura para cima e com o cabelo desalinhado. Deixou cair os
ombros, conformada, e pensou que a primeira vez deles não tinha sido, definitivamente, nada
romântica, mas, em compensação, fora memorável.


Só voltou a cair em si ao entrar em casa e ao deparar com João Pedro sentado no sofá da sala com
o bebé nos braços, ambos cobertos da papa que ele tentava ingloriamente enfiar-lhe na boca. Clara
reparou que não estava a ter grande êxito. João Pedro suspirou.
— Ainda bem que chegaste — disse, aliviado.
Clara forçou um sorriso para disfarçar o sentimento de culpa que a assolou. Os gémeos já se
levantavam do chão e distraíam-se momentaneamente do televisor para irem assaltá-la, agarrando-se
às suas pernas a chamar por ela. Reclamavam a atenção da mãe. Clara abaixou-se para os beijar.
João Pedro esticou os braços para lhe entregar o bebé, mas ela, horrorizada com a possibilidade de
ele descobrir o que andara a fazer, recusou com demasiada veemência.
— Não, não, continua que estás a ir muito bem. Eu vou só lá acima e não demoro. Preciso de tomar
um banho rápido, que estou toda colada — disse, arrependendo-se logo de ter empregado esta
expressão. Corou, sem querer, atraiçoada pelo significado comprometedor do que acabara de dizer e,
antes que ele reparasse no vermelhão que lhe assomava ao rosto, deu meia volta e precipitou-se para
fora da sala.
Fechou-se na casa de banho, despiu-se, atirou a saia, a camisa e o resto para o cesto da roupa suja,
enfiou-se debaixo do chuveiro a sentir-se uma idiota por ter reagido daquela forma, como se fosse
possível João Pedro perceber alguma coisa apenas pela aproximação. Fechou os olhos, grata pela
água muito quente que lhe escorria pelo corpo, lavando-a de todos os vestígios do delito. Que
estúpida!,
pensou. Tenho de me controlar. Ele não vai dar por nada, se não me comportar
normalmente é que levanto suspeitas.

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