Uma noite em Nova York

(Carla ScalaEjcveS) #1

perder de vista até ao fundo azul de um céu esplêndido. De repente, já não
tinha vontade de chorar, sentiu antes uma fúria passar por ela, um desejo de
explodir, uma urgência de falar com Rui e confrontá-lo com o que acabara de
acontecer, de lhe pedir explicações, de lhe lançar acusações. Ligou-lhe
novamente para o celular, sem sucesso, continuava indo direto para a caixa
postal. Não deixou nenhuma mensagem, desligou. Deixou-se cair para trás,
ficando quase deitada no sofá, frustrada.


Ergueu-se de novo, endireitou-se com um pensamento. Pegou o celular,
começou a escrever-lhe uma mensagem, hesitou, disse em voz alta não, não,
não pode ser assim, tenho de falar com ele. Atirou o aparelho para o lado.
Passou as mãos pelo cabelo, apanhando-o e puxando-o e repuxando-o para
trás com os mesmos gestos que usaria para fazer um rabo-de-cavalo, embora
não o fizesse. Era só uma expressão do seu embaraço, do seu desespero.
Estava realmente aflita. Precisava de apoio e, paradoxalmente, a pessoa que
devia apoiá-la era a mesma que a deixava naquele estado.


Rui devolveu-lhe a chamada uma hora e meia depois. A sua voz era tranquila,
inocente. Isabel teve vontade de implorar por ajuda, de lhe pedir que a
sossegasse, que lhe garantisse que tudo não passava de um engano e que
ainda a amava e tinha saudades dela. Mas não fez nada disso, respirou fundo e
foi direto ao assunto, sem rodeios, dura.


– Liguei para o teu quarto, quem atendeu foi uma mulher. O que é que está
acontecendo, Rui?


– Ligou? Só cheguei agora. Tive um jantar de trabalho.
– Você não ouviu o que acabei de dizer, Rui?! Atendeu uma mulher. – A
voz saiu-lhe quase estridente, mas não se importou muito com isso.


– Ouvi, Isabel. Devem ter lhe passado para o quarto errado.
– O número do teu quarto não é o 309?
– Não, é o 304.
– Não me enrole – respondeu, furiosa, certa que ele lhe mentia
descaradamente.


–   Isabel, o   meu quarto  é   o   304.    Passaram    a   ligação para    o   quarto  errado.
– Ah, e, por coincidência, estava lá uma portuguesa.
– É possível, sei lá.
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