– Então, está bem, vou ligar outra vez para o hotel e peço para me darem o
quarto 304.
– Faça isso – disse Rui, sem tentar impedi-la.
Isabel desligou, marcou o número do hotel, pediu o quarto 304. Tinha
noção de que era horrível fazer isso, duvidar dele e colocá-lo à prova, mas
não se conteve, nem sequer pensou duas vezes. Rui atendeu.
– Sou eu – disse. – Está mais descansada?
Isabel não sabia o que pensar. A desconfiança roía-a. O comportamento de
Rui nos últimos tempos batia certo com o incidente do telefonema. Embora
ele lhe tivesse demonstrado que estava em outro quarto, de fato, Isabel não
ficou completamente convencida. O instinto dizia-lhe que ele mentira. Uma
hora e meia era tempo mais do que suficiente para pedir um quarto novo. Rui
podia ter inventado uma desculpa, ter feito uma reclamação ou subornado
alguém, vai saber, podia ter-se desenvencilhado para conseguir mudar do
para o 304.
Às onze da noite, Isabel continuava sentada no sofá, imóvel, perdida, à deriva
numa contradição de pensamentos. Queria muito acreditar na versão dele,
aceitar que tinha sido só um engano, uma troca de números de quartos e deitar
o pesadelo para trás das costas, esquecer. Mas a realidade abatia-se sobre ela,
impondo-se com um peso brutal, abrindo caminho na bruma, tornando tudo
muito claro na sua cabeça, por mais que quisesse negar.
Tinham acabado a conversa bem. Prevalecera, momentaneamente, a
explicação de Rui e a contraprova do telefonema para o hotel, para o quarto
“Depois falamos quando você voltar”, dissera Isabel, antes de se
despedir e desligar. Ela não tinha como afirmar sem qualquer contestação,
evidentemente, mas havia uma voz persistente na sua cabeça que lhe dizia
“você foi enganada”.