Uma noite em Nova York

(Carla ScalaEjcveS) #1

que um homem pudesse necessitar para preparar uma refeição decente
encaixados em móveis de portas lacadas, azul-escuras. Jonas partiu cinco
ovos numa tigela, bateu-os e mexeu-os numa frigideira. Sentou-se em uma
mesa alta, um prolongamento da bancada ao lado da lava-louças, com os pés
descalços apoiados no ferro cromado do banco, numa posição indolente, o
cotovelo esquerdo apoiado no tampo, a mão direita manejando o garfo,
comendo os ovos e com a cabeça trabalhando devagar, recapitulando a noite
anterior, vasculhando na memória enevoada em que discoteca teria
encontrado e conquistado a jovem que continuava dormindo em sua cama, no
seu quarto. O bater metálico do garfo no prato era o único som audível nos
duzentos metros quadrados que, ao fundo, terminavam numa janela
panorâmica sobre o rio prateado. Os vidros duplos impediam que Jonas
escutasse o trânsito intenso da marginal que passava em frente ao edifício. O
apartamento ficava à altura de um segundo andar, embora tivesse por baixo
apenas um piso, igualmente espaçoso, mas vazio, que lhe servia de garagem.
No ponto onde se encontrava, sentado à mesa, Jonas só avistava a linha do
comboio para lá da estrada e, mais para lá ainda, o rio. Levou uma garfada de
ovos à boca, mastigou-os lentamente, fazendo um esforço para se lembrar,
mas a última lembrança que lhe restava era de ter terminado a noite ali em
casa com três amigos e quatro garotas, um grupo de amigas, supunha, que se
teria juntado a eles em algum lugar depois do jantar num restaurante nas
docas.


A moça surgiu à porta do quarto, encostou-se à ombreira da porta, nua,
enrolada no lençol que trouxera da cama. Fez uma cara engraçada, abriu
muito os olhos e sorriu, um sorriso entre o ingênuo e o culpado, como uma
garotinha com a consciência de ter sido apanhada fazendo bagunça. “Meu
Deus”, pensou Jonas, com o peito apertado de emoção, “não deve ter mais de
dezenove, vinte anos”. Era muito bonita, loura, cabelo liso, ligeiramente
desgrenhado, louro natural, olhos castanho-claros, nariz pequeno e, tanto
quanto ele se lembrava, seios pequenos, barriga lisa, as nádegas e as pernas...
bem, uma perfeição.


–   Bom dia –   disse   ela.
– Bom dia – respondeu-lhe. – Tá com fome?
– Esfomeada.
– Vem comer. Fiz uns ovos mexidos.
Ela se aproximou, descalça, parecendo uma ninfa deslizando pelo chão,
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