Uma noite em Nova York

(Carla ScalaEjcveS) #1

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Acabou de escrever uma notícia, a quinta dessa tarde, “finaliza primeiro as
notas”, pedira o editor. Atendeu ao pedido automaticamente, sem grande
esforço intelectual, uma coleção de curiosidades bobas sobre estrelas
internacionais. Perguntava-se a quem é que interessava saber que uma atriz do
outro lado do oceano tem um novo namorado, uma nova casa ou, já agora,
próteses de silicone novas? Mas a verdade é que interessava a muita gente.
Para Catarina era só trabalho e, como todos os trabalhos, tinha partes boas e
partes ruins. Escrever as notas não era propriamente o seu ideal de uma tarde
bem passada na redação, mas naquela tarde sentia-se distraída e foi bom não
ter em mãos nada que exigisse toda a sua concentração.


A cabeça vagueava. Havia nela uma insatisfação latente por causa da sua
relação com Ricardo. Estavam juntos há cinco anos, mas atualmente as suas
vidas tinham muito pouco em comum, não havia um telefonema, não
almoçavam nem jantavam um com o outro, chegavam tarde e mergulhavam
na cama, normalmente sem fazer amor. Não tinham filhos, andavam adiando
há quanto tempo? Desde sempre, pensou.


O dedo clicou no botão esquerdo do mouse, a tela saltou para a caixa de
mensagens, nada de novo, o dedo clicou novamente no botão do mouse, a tela
voltou para as notas. Passara a tarde nisto. Subitamente, deixara de receber
mensagens de Jonas, nem uma desde que, contra todas as expectativas – as
suas, pelo menos –, lhe respondera ao e-mail a que se rendera pela música.
Pensava “ainda bem que ele desistiu”, mas a alma espicaçada por uma
pontada de desilusão não a deixava ignorar o assunto, e assim continuou pela
tarde verificando a caixa de mensagens, sentindo-se aliviada por não receber
nenhuma, ao mesmo tempo decepcionada pela mesma razão.


A relação de Catarina com Ricardo não excedera em nada a sua expectativa,
vulgar, contudo ambiciosa: qualquer coisa como uma paixão duradoura, um
entusiasmo permanente, um amor que se alimenta a cada dia que passa,
tornando-se mais e mais forte, como um laço inquebrantável, fazendo das
suas vidas uma felicidade crescente. Uma banalidade, portanto, não fosse ela
uma mulher banal e, como tal, sonhasse com muito e se contentasse com
pouco. Com efeito, o tempo selara um compromisso, uma cumplicidade, uma
rotina se quisermos, que dificilmente se desfaria. Para Catarina, o que tornava

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