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O show estava marcado para as 20 horas no BB King Blues Club and Grill
NY, uma sala de espetáculos clássica, situada na Times Square. Catarina
queria chegar cedo para conseguir falar com Jonas antes do espetáculo. Mas,
à medida que caminhava para lá, uma dúvida foi se instalando na sua cabeça.
Fazia bastante frio na rua, e ela percebeu que não poderia ficar muito tempo
parada no mesmo lugar, quando se deteve à frente de uma vitrine, alheia ao
movimento ao redor. Pôs-se a admirar os artigos expostos, bolsas de pele,
botas de todos os feitios, mas depois teve uma preocupação, pensou se estaria
suficientemente bem arrumada e atraente, e logo os seus olhos se focaram no
vidro da vitrine e descobriu-se no reflexo. Trazia botas altas pretas por cima
dos jeans e um suéter de gola alta de caxemira bege. Tinha as mãos enfiadas
nos bolsos largos do casaco de lã vermelho para evitar que os dedos
petrificassem; os caracóis louros caídos sobre os olhos castanho-claros,
ligeiramente pintados. Os lábios bem desenhados no batom vermelho
sobressaíam na pele branca do rosto. Catarina viu escapar da boca o ar frio
que expirava, como se estivesse fumando. Os pés começaram a doer e ela
bateu com eles no chão para reativar a circulação. Sentindo-se congelar,
retomou a caminhada.
Tomara a decisão de viajar para Nova York um dia antes. Esperou ansiosa por
Ricardo já com as malas na porta de casa e, quando ele chegou, disse-lhe
“vou-me embora”.
– Você vai embora? A esta hora? Mas onde é que você vai?
– Não percebe? Vou embora de vez.
Ele quase riu, julgando que era uma piada.
– Assim, de repente? O que é que te deu?
– Ricardo – disse –, eu pensei muito nisto. A verdade é que eu... eu já não
te amo.
– Você tem outro?! – exclamou ele, atônito. – É isso, arranjou outro?
– Não é esse o problema. O problema somos nós, caso contrário, nem se
punha a questão de eu ou você arranjarmos outra pessoa.