Uma noite em Nova York

(Carla ScalaEjcveS) #1

qual o carro bateu nele e o seu voo desamparado, caindo vários metros à
frente, jurou logo ali, sem a menor hesitação, que o homem estava morto, se
não de imediato, a caminho do hospital, pois certamente já ninguém poderia
fazer nada por ele. Mas a realidade revelou-se bem mais benevolente do que o
dramatismo popular. O embate com o para-choques foi o que lhe provocou os
piores danos, colhendo-o pelos joelhos, quebrando-lhe as pernas como
pauzinhos frágeis. Todo o resto foi mais impressão e muitos arranhões. A
cabeça estava bem e não teve lesões internas nos órgãos vitais.


Quando o visitou no dia seguinte, algumas horas depois de Filipe ter
acordado na área pós-cirúrgica, Patrícia encontrou-o aturdido pelo efeito das
drogas para as dores, sofrido, mas, apesar de tudo, positivo e animado.


– Olha, a minha salvadora – comentou, mal a viu entrar.
Patrícia sorriu, agradada com o humor dele.
– Estou vendo que nada te faz perder a boa disposição – disse.
– É você que me anima.
– Nem o descaramento – acrescentou ela.
Filipe estendeu-lhe uma mão a custo, talvez um pouco teatral.
– Ainda não nos apresentámos como deve ser – disse. – Chamo-me Filipe.
Ela aproximou-se dele, tomou a sua mão.
– Patrícia.
– Já deve ter rogado muitas pragas por me ter conhecido, imagino. Até
agora, só lhe dei chatices.


– Perdi o ônibus e cheguei atrasada por sua causa – admoestou-o, fingindo-
se zangada.


– Mas, para compensar, consegui-lhe uma carona na ambulância e uma boa
desculpa para não chegar a tempo ao trabalho.


Patrícia não conteve o riso.
– As coisas que eu invento para conhecer uma mulher – disse Filipe,
abanando a cabeça, fazendo-se incrédulo consigo próprio.


– Ah, realmente!
Muito tempo depois de tudo isto acontecer, referindo-se à forma como se
conheceram, Filipe continuaria a gracejar por anos afora, afirmando que
quase morrera de amor por ela.

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