Uma noite em Nova York

(Carla ScalaEjcveS) #1

– E não disse se vinha amanhã?
– Olhe, a resposta que ela me deu foi que se você perguntasse isso, para lhe
dizer que sai de férias amanhã e para não ficar esperando-a.


– Ela disse isso? – perguntou Filipe, incrédulo.
– Disse. E olhe que, se eu fosse você, não tinha muitas esperanças, porque a
doutora não me pareceu nada contente. Não sei o que aconteceu, mas ela
estava com ar de poucos amigos.


Filipe teve vontade de saltar para o chão e corrê-la do quarto a pontapé, não
fosse a sua condição de inválido, estendido de comprido na cama com as
pernas fossilizadas no gesso. Em vez disso, perdeu-se no desalento da
frustração, arrefecendo a fúria numa impotência desarmante.


Até então, graças à Patrícia, Filipe conseguia ver algo de positivo no seu
infortúnio. Mesmo de pernas partidas na prostração incapacitante do seu leito,
restava-lhe a alegria das suas visitas, mas se Patrícia não viesse mais, pensou,
como iria resistir ao martírio do hospital?


As semanas restantes de internação pareceram-lhe duros meses de espera,
como um preso na solitária. Patrícia manteve-se inabalável no seu propósito
de não voltar a vê-lo e nem a marcação cerrada que Filipe fez à enfermeira
impertinente a demoveu, pois ignorou os recados diários que a ela chegavam
até ele desistir de enviá-los, ao fim de quinze dias. Em contrapartida, Filipe
escreveu-lhe uma nota de amor todas as tardes e guardou-as com o objetivo
firme de entregá-las logo que recuperasse as suas pernas e pudesse sair
daquela cama para ir ao seu encontro. Animou-se com a certeza de que
conseguiria convencer Patrícia a falar com ele novamente, muito embora, na
clareza do seu plano, visto e revisto, não lhe tivesse ocorrido a possibilidade
de algum contratempo.

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