Público - 17.09.2019

(C. Jardin) #1
Público • Terça-feira, 17 de Setembro de 2019 • 3

causa das sanções impostas pelos
EUA no último ano.
“Lembram-se de que os iranianos
abateram um drone e disseram que
tinha sido no seu espaço aéreo, quan-
do nem sequer foi perto? Eles manti-
veram essa versão sabendo que era
mentira, e agora dizem que não têm
nada que ver com o ataque na Arábia
Saudita. Vamos ver”, disse Trump
ontem, no Twitter, referindo-se ao
abate de um drone norte-americano
pelo Irão, em Junho. Nessa altura, o
Presidente dos EUA disse que travou
um ataque contra o Irão a poucos
minutos da hora marcada.
Ontem à tarde, um porta-voz do
Exército saudita aÆrmou, em confe-
rência de imprensa, que os drones
usados no ataque de sábado são de
fabrico iraniano. O coronel Turki al-
Malki, da coligação liderada pela Ará-
bia Saudita que combate no Iémen,
disse ainda que os ataques não foram
lançados a partir do Iémen, segundo
as investigações preliminares.
O Governo iraniano desmente a
acusação de Washington e de Riad, e
diz que ela só se explica porque a
estratégia norte-americana de máxi-
ma pressão sobre o Irão “falhou” —
uma referência à saída dos EUA do
acordo internacional sobre o progra-


ma nuclear iraniano, em Maio de
2018, e à reposição e endurecimento
das sanções económicas.
As investigações estão a decorrer,
mas os EUA parecem afastar a hipó-
tese de os drones terem sido lançados
a partir do Iraque, de uma zona con-
trolada por um grupo xiita apoiado
pelo Irão. Segundo o Governo iraquia-
no, foi isso que o secretário de Estado
dos EUA, Mike Pompeo, disse ao pri-
meiro-ministro do Iraque.
Seja qual for a origem, é provável
que o ataque enterre de vez a propos-
ta francesa para uma reaproximação
entre os EUA e o Irão, que tinha como
objectivo salvar o acordo sobre o pro-
grama nuclear iraniano.
Ainda que Washington se mante-
nha cauteloso quanto a uma interven-
ção no Irão, é possível que a Arábia
Saudita queira responder com ata-
ques em território iraniano.
E a hipótese de haver um erro
numa situação cada vez mais compli-
cada deixa alguns especialistas
apreensivos: “Estamos a falar de um
novo nível de confronto”, disse à
Foreign Policy Farea al-Muslimi, do
Centro de Estudos Estratégicos de
Sana, no Iémen.

[email protected]

ESSAM AL-SUDANI/REUTERS

Mercados agitados com incerteza


na produção saudita


A


paragem forçada de um dia
para o outro de instalações
petrolíferas responsáveis
por cerca de 5% produção
mundial lançou ontem nos
mercados um clima de
incerteza relativamente à estabilida-
de futura do fornecimento interna-
cional de petróleo, provocando uma
subida de preços diária como já não
se via desde a Guerra do Golfo em
1991.
A meio da tarde, o preço do barril
de petróleo Brent situava-se ligeira-
mente acima dos 60 dólares, uma
subida de 10,5% em relação ao valor
de fecho da sessão anterior. No entan-
to, nos primeiros minutos da sessão,
a reacção dos mercados foi ainda
mais extrema, chegando a registar-se
uma subida de 19%, para perto dos 72
dólares por barril.
Esta primeira resposta, de forte
pessimismo, registada nos mercados
logo pela manhã foi uma reacção aos
eventos extraordinários de sábado
passado. Ataques de drone realizados
durante a madrugada atingiram as
instalações da Aramco, a empresa
estatal da Arábia Saudita e maior pro-
dutora do mundo de petróleo.
A acção, reivindicada pelos rebel-
des houthi do Iémen como retaliação
à intervenção neste país das forças
militares sauditas, forçou à paragem
de 50% da capacidade de produção
petrolífera da Arábia Saudita, isto é,
5% do total da produção mundial foi
afectada.
Esta redução repentina do nível de
produção de crude é o suÆciente para
fazer subir o preço da matéria-prima
nos mercados, dada a necessidade de
encontrar um novo equilíbrio, mes-
mo que temporário entre a oferta e a

procura. Mas o que acaba por inÇuen-
ciar mais os preços é a ideia de que
poderemos estar perante o início de
uma fase de ainda maior instabilidade
numa região do globo fulcral para o
sector energético.
A reacção dos EUA, com Donald
Trump a dizer que estão “carrega-
dos e prontos” para responder ao
ataque às reÆnarias sauditas, estan-
do a ser analisada uma eventual
responsabilidade do Irão nos acon-
tecimentos, faz com que exista a
expectativa de uma escalada da ten-
são no Médio Oriente.
Para já, a dúvida mais imediata resi-
de em saber quando é que Aramco
conseguirá retomar totalmente as
suas actividades. Não foi ainda avan-
çada uma data deÆnida para o resta-
belecimento da normalidade nas
reÆnarias afectadas, mas à CNN duas
fontes da empresa disseram que um
regresso ao anterior nível de produ-
ção poderia demorar “semanas”.
Depois, será preciso também per-
ceber quais os desenvolvimentos
políticos e militares na região, nomea-
damente a resposta dos EUA ao Irão,
para se poder avaliar qual o impacto
de mais longo prazo no nível de ofer-
ta e nos preços do petróleo.
Numa tentativa de limitar os efeitos
nos preços, o Presidente norte-ame-
ricano anunciou que as reservas de

Sérgio Aníbal


petróleo do país poderiam ser utiliza-
das em caso de necessidade. Outros
países, como a Rússia Æzeram questão
de deixar claro que têm espaço de
manobra, seja ao nível dos stocks seja
ao nível da capacidade de produção,
para reforçar a oferta e compensar,
pelo menos temporariamente, a dimi-
nuição da produção saudita.
Existem dúvidas, contudo, quanto
ao esforço de aumento da oferta que
será efectivamente realizado por
alguns países. Antes do incidente, a
discussão entre os principais produ-
tores mundiais era sobre a implemen-
tação dos acordos de limitação de
oferta, numa tentativa de evitar des-
cidas de preços que colocassem em
causa a rentabilidade do negócio de
produção e venda de petróleo.
Para Portugal, como país consumi-
dor, pouco mais há a fazer do que
lidar com a subida de preços, que
acabará inevitavelmente por produzir
os seus efeitos junto dos consumido-
res Ænais. Ainda assim, uma subida
do preço do petróleo nos mercados
internacionais não se reÇecte de for-
ma imediata no preço dos combustí-
veis suportado pelos consumidores.
Tanto nas subidas como nas descidas
de preços, regista-se um tempo de
intervalo, de algumas semanas, entre
o momento em que os custos se alte-
ram ao nível da produção da matéria-
prima e o momento em que o produ-
to reÆnado chega ao consumidor.
A Entidade Nacional para o Sector
Energético garantiu em comunicado
que “dispõe de reservas estratégicas
que podem ser mobilizadas para
suprir uma falta eventual”, precisan-
do que tem “à sua disposição 538,
mil toneladas de crude em reservas
físicas e 373,5 mil toneladas em
tickets que representam direitos de
opção sobre crude armazenado em
Portugal e noutros países da União
Europeia”.
A Arábia Saudita ocupou em 2018
o quarto lugar entre os principais
abastecedores de petróleo em Por-
tugal.

Preços chegaram a estar
a subir quase 20% num dia,
depois do ataque de drones
a instalações petrolíferas
na Arábia Saudita

Mohammed bin Salman [email protected]

Para Trump, os
iranianos são os
responsáveis pelo
ataque. E a coligação
liderada pela Arábia
Saudita que combate
no Iémen disse que os
drones não foram
lançados a partir
deste país

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