SEGUNDA,04 DE MARÇO DE 2019 OPINIÃO
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Custo é do criminoso
O ócio é a moradia do diabo. A não
ocupação produtiva do sujeito ali-
menta frustrações e rancores, prin-
cipalmente no tocante a alguém pre-
so! Tal situação fomenta a cultura da
delinquência, e isso todos concor-
dam. O trabalho prisionaléamelhor
forma de ocupar o tempo ocioso do
condenado e diminuir os efeitos cri-
minógenos da prisão e, a despeito de
já ser obrigatório, hoje é um direito
do apenado, e pela lei atual será
sempre remunerado. É muito caro
manter uma pessoa reclusa, e o art.
145, II, da Constituição Federal prevê
que a União, Estados e até municípios
podem cobrar taxas pela utilização
de serviço público específico. Ora,
nada mais didático do que o preso
saber que o custo que o Estado tem é
de sua responsabilidade por ter co-
metido o crime.
Daí não ser inconstitucional o projeto
que prevê a obrigatoriedade do preso
ressarcir as despesas de sua prisão.
Porém, cabe registrar que hoje os
presídios só proporcionam trabalho
para cerca de 16% dos presos, sendo
imensa a dificuldade dos governos
estaduais de fomentar a geração de
postos de trabalhos. E isso não é
porque o preso não quer trabalhar, ao
revés, quer muito, pois com o trabalho
ele já teria outro benefício, chamado
remição, abatendo um dia de pena a
cada três dias trabalhados. Só que os
governos não criam frentes de tra-
balho e aí a questão: se ele quer
trabalhar, até mesmo para ressarcir ao
Estado, mas não tem onde fazê-lo,
seria justo mesmo assim cobrar sua
permanência? Acredito que não.
Mas voltando ao objeto do projeto, a
obrigação de ressarcir, o mesmo já é
feito em vários países. Tive a opor-
tunidade de ver em presídios ame-
ricanos que os presos recebem a conta
pelo número de diárias de perma-
nência. Não podendo pagar, ficam
negativados junto ao governo como
qualquer devedor de tributos.
Concluindo, o trabalho nas prisões
atenderia a vários objetivos: resso-
cializar e diminuir a população car-
cerária pela remição da pena, a pre-
paração daquele para o ambiente de
trabalho com o aprendizado de algum
ofício para quando retornar ao con-
vívio social,eoressarcimento do Es-
tado. Mas, para isso, os governos pre-
cisarão reconstruir a cultura da ar-
quitetura e administração prisional,
visando a construção de frentes de
trabalho, para que possamos, aí sim,
efetivar a proposta legal em discussão.
Preso tem mais é que trabalhar, e ter
condições de dignidade. Se não por
direito, por eficiência administrativa.
E este é um desafio que o projeto traz.
A lei deve trazer essas novas obri-
gações para os presos, mas deveria
também trazer obrigações para os go-
vernos criarem políticas de trabalho
prisional. Todos sairiam ganhando.
CARLOS EDUARDO RIBEIRO LEMOS
É juiz de Direito estadual, professor de Direito Penal da FDV e mestre em Direitos
e Garantias Constitucionais
Não é inconstitucional
o projeto que prevê a
obrigatoriedade do preso
ressarcir despesas da prisão
Gestão eficiente
O Brasil tem vivido um período conturbado
e sensível. Muito se questiona sobre esse
enredo político com o pacote anticrime do
ministro Sérgio Moro, o texto da Proposta
de Emenda à Constituição (PEC) da Pre-
vidência e a escassez de recursos hídricos,
entre tantos outros problemas. São muitos
os temores e especulações, inclusive, o
cenário tem sido alvo de análises es-
trangeiras não muito animadoras.
A população, por sua vez, clama por
respostas e, para além de palavras, por
ações. Todo esse contexto nos coloca de
frente para uma prática que deve ser a
base de um governo: sua gestão. É a partir
dessa ferramenta que se constitui todo o
planejamento e execução de ações dentro
de municípios e Estados.
Desse modo, se o povo se pronuncia é
evidente que ele está criticando a conduta
de seus gestores e a forma como co-
mandam a economia, a política, entre
tantos outros pontos cruciais para a ma-
nutenção de uma estrutura social. No
cerne dessa movimentação logo se en-
contra a raiz: a má gestão pública que
ainda vivemos em nosso Brasil.
Por outro lado, existe uma preocupação
pela melhoria da qualidade dos serviços
públicos, afinal, nosso contexto social
exige mudanças cada vez mais rápidas e
intensas. Uma mostra dessa apreensão
foi a inclusão do princípio da eficiência
na Constituição, por meio da Emenda
Constitucional nº 19, de 4 de junho de
- Nela, são dispostos os princípios e
as normas referentes a administração
pública, servidores e agentes políticos,
assim como controle de despesas e fi-
nanças públicas, por exemplo.
Essa modificação é fundamental pa-
ra a melhoria contínua da gestão go-
vernamental e, consequentemente, de
sua evolução para o patamar de uma
real eficiência. Isso pressupõe a ideia
de qualidade, presteza e resultados
positivos, de modo que sempre sejam
atendidas as demandas do coletivo.
O princípio da eficiência pressupõe o
melhor aproveitamento possível dos re-
cursos financeiros, um maior controle
de todo o processo administrativo. Em
poucas palavras, trata-se de manter um
nível alto de organização de recursos
tanto materiais quanto humanos. Em
suma, é transformar a administração
burocrática, famosa em nosso histórico,
em uma de cunho gerencial.
No que isso implica além do que já foi
pontuado? Estamos falando de métodos
mais avançados de gestão, menores custos,
mais qualidade e agilidade na prestação
dos serviços. Num modo mais amplo, é
investir em tecnologias, em condições ade-
quadas de trabalho, em mudanças de
cunho cultural dentro da instituição. Mas
não nos esqueçamos de outro ponto ex-
tremamente importante nesse processo
evolutivo: o aperfeiçoamento de gestores e
agentes públicos. Também é preciso em-
pregar esforços no sentido de capacitá-los
nessa filosofia de gestão, a fim de que
sejam ainda mais eficientes, defensores da
ideia e agentes empenhados nessa causa.
GISELLE COELHO
É consultora de Relações Governamentais
A eficiência pressupõe
melhor aproveitamento dos
recursos e maior controle
do processo administrativo
Compliance, trânsito e as
corrupções do cotidiano
Combate à corrupção, ética e transparência
são demandas que a população tem em
relação aos políticos, empresários e ins-
tituições. Não podemos esquecer, contudo,
que a corrupção no Brasil é endêmica e,
assim, como um vírus letal, atinge todos os
setores da sociedade, sendo nosso dever
combatê-la em nossos pequenos atos.
No Paraná, foi realizado um experimento
social que ficou famoso e se espalhou pelo
Brasil: o “teste do picolé”. Trata-se de um
teste de honestidade: um freezer com
picolés fica à disposição em um ambiente
coletivo, sem ninguém por perto vigiando
ou cobrando. Experimenta a confiança na
integridade de cada cidadão, que se ma-
nifesta, principalmente, na ausência dos
mecanismos de controle. Cabe a cada
cidadão fazer o que é certo porque é certo
- e não em razão de uma sanção iminente
por descumprimento das normas.
Entretanto, não é isso que se verifica ao
observarmos o trânsito da Grande Vitória.
Nos horários de pico, formam-se filas de
veículos nas principais vias de acesso e
motoristas impacientes utilizam a con-
tramão ou a faixa da esquerda para furar a
fila. Esse comportamento denota uma falta
de respeito com o outro, uma pretensão de
superioridade – como se o seu tempo
valesse mais que o do restante das pessoas.
São muitas as justificativas mentais para
essas “manobras”, que atrapalham o trân-
sito, provocam obstruções e até acidentes.
Em Vila Velha, por exemplo, no acesso
matinal à Terceira Ponte, essa situação é
corriqueira. Quando há fiscalização pela
Guarda Municipal, esses comportamentos
são coibidos. Por outro lado, na ausência
dos agentes, os motoristas “espertinhos”
furam a fila implacavelmente. Há em nós
um déficit ético, um lapso de integridade.
Como podemos esperar e cobrar com-
portamentos éticos dos nossos governan-
tes se, no dia a dia, o cidadão busca se
aproveitar de qualquer vantagem que lhe
aparece? Como se afirmar intolerante
com a corrupção, enquanto se praticam
“pequenas” infrações cotidianamente?
Se é verdade que “cada povo tem o
governo que merece”, façamos por merecer
governantes melhores com nossos peque-
nos, porém grandiosos, gestos rotineiros.
Nosso exemplo tem efeito multiplicador e
pode contribuir significativamente para
construir o Brasil que queremos.
ARTHUR LEAL ABREU
É mestrando em Direito e especialista em Compliance pela FDV
FLÁVIA MARCHEZINI
É vice-presidente de Compliance na Rede Brasileira de Cidades Inteligentes e Humanas
Como cobrar comportamentos éticos dos governantes se, no dia
a dia, o cidadão se aproveita de qualquer vantagem que aparece?
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