A Gazeta [ES] 6 03 2019

(Pinheirojpa) #1

QUARTA,06 DE MARÇO DE 2019 OPINIÃO
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Congresso. Conhecendo a tessitura do
crime organizado na cidade, dificil-
mente Jair Bolsonaro perfilhará a le-
galização do jogo.
No mundo real, a única pessoa te-
nuemente interessada nas torres e no
cassino prometidos por Crivella é o
bilionário americano Sheldon Adelson,

que tem complexos de tu-
rismo e jogo em Las Vegas,
Macau e Singapura. Ele
começou a trabalhar aos
12 anos (tem 85) e já jun-
tou US$ 33,3 bilhões. É
um campeão da causa de
Israel e a ele se atribui a
abertura dos cofres de
muitos republicanos para
Donald Trump. É também
um protetor do primei-
ro-ministro Benjamin Ne-
tanyahu. Dele viriam os
R$ 10 bilhões imaginados
por Crivella.
O Porto Maravilha de
Eduardo Paes atolou por-
que era um projeto de-
mófobo. O Rio da Zona
Portuária nunca poderia
ter sido o que é o Puerto
Madero argentino, como a
Barra da Tijuca nunca será
uma Miami. Aquela área
está num bairro popular e
centenário. Quem quiser
conferir, que ande pelas
ruas da Gamboa e de São
Cristóvão. A megalomania
imobiliária encalhou por-
que foram poucos os in-
teressados em levar suas
empresas para lá. Ali, o
povo do Rio sempre viveu
em casas modestas. Miami
é em outro lugar.
Na região do Porto Maravilha cons-
truíram-se dois novos museus. A poucos
quilômetros dali, pegou fogo o Museu
Nacional. (Quarenta anos antes, in-
cendiou-se o Museu de Arte Moderna.
Ganha um fim de semana em Caracas
quem souber de outra cidade com se-
melhante desempenho.)

Crivella quer


o Porto Jogatina


ELIO GASPARI
É jornalista

O prefeito defende a legalização da jogatina para salvar
um projeto megalomaníaco atolado na Zona Portuária do Rio

Inspeção conjunta


Declarações recentes da responsável pela
pasta do Ministério da Agricultura, Pe-
cuária e Abastecimento (Mapa), a ministra
Tereza Cristina, fizeram emergir no ce-
nário jurídico-político nacional a discussão
sobre o modelo de inspeção de produtos
cárneos que deve ser adotado no país.
A solução proposta pela ministra consiste
na redução do papel do Estado na ins-
peção de tais produtos, que passaria a ser
preponderantemente realizada pelos fun-
cionários das empresas, combinada com
auditorias e fiscalizações periódicas rea-
lizadas por fiscais oficiais do Mapa.


A reforma regulatória parece ter como
objetivo corrigir insuficiências do modelo
atual, que exige a presença diária e cons-
tante de fiscais federais agropecuários, vin-
culados ao Sistema de Inspeção Federal
(SIF), nos locais de produção. Esse modelo
exclusivamente público tem resultado, na
prática, numa limitação da capacidade de
produção desse setor, vez que o governo
tem sido incapaz de contratar funcionários
necessários para atender às necessidades
de fiscalização das empresas brasileiras.
A cooperação público-privada nas ati-
vidades de inspeção já é uma realidade

adotada pelo Mapa, a exemplo do pro-
grama nacional de combate à tuber-
culose desenvolvido em 2016, quando
se permitiu a atuação de médicos ve-
terinários privados nas atividades de
inspeção da doença, desde que sub-
metidos à supervisão governamental.
A regulação dessa atividade em outras
localidades - como nos EUA e na União
Europeia - tem indicado em sentido se-
melhante. O Regulamento 882/2004 do
Parlamento Europeu e do Conselho da
União Europeia, por exemplo, prevê que os
controles oficiais de alimentos de origem
animal se darão apenas periodicamente,
com frequência e intensidade proporcio-
nais aos riscos envolvidos para cada pro-
duto. É de se destacar, ainda, que o
Departamento de Agricultura americano,
desde 1997, vem adotando gradativamente
um sistema de inspeção descentralizada,
em que os exames anatômicos e pato-
lógicos de carcaças são realizados por
empregados das plantas e submetidos a
posterior avaliação e verificação de con-
fiabilidade por inspetores do Food Safety
and Inspection Service (FSIS).
O antigo ministro da Agricultura, em
declarações recentes, demonstrou preocu-
pação com essas propostas de alteração,

chamando atenção para a suposta exi-
gência dos países importadores desses pro-
dutos - sobretudo os EUA - de que os
agentes de inspeção tenham vínculo em-
pregatício com o governo. Uma análise
detida das normas americanas de impor-
tação de produtos alimentícios, no entanto,
demonstra que as autoridades daquele país
não parecem exigir que a inspeção seja
necessariamente realizada por pessoal con-
tratado pelo Poder Público. Entende-se que
a principal determinação americana é a de
que aqueles que realizam os controles
oficiais sejam pagos pela Administração,
direta ou indiretamente, o que, nesse último
caso, segundo expressa disposição nor-
mativa, pode representar a contratação de
inspetores através de uma terceira pessoa.
Assim, a adequação das atividades
de inspeção brasileiras a essas ten-
dências internacionais, se realizada
de forma adequada, estabelecendo-se
protocolos de procedimentos e ga-
rantindo-se rigorosa supervisão ofi-
cial, parece ser capaz de assegurar a
qualidade dos alimentos e a eficiência
da produção para o abastecimento do
mercado nacional e internacional, o
que não vem sendo atingido pelo mo-
delo atualmente adotado.

RODRIGO MUDROVITSCH
É professor de Direito Constitucional, doutor em Direito Público e advogado

Adequação das atividades de inspeção parece ser capaz de


assegurar qualidade dos alimentos e eficiência da produção


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Num mesmo dia, o prefeito Marcelo
Crivella disse que “o Rio de Janeiro é o
epicentro da corrupção” e anunciou um
futuro radiante para o projeto do Porto
Maravilha. Prometeu R$ 10 bilhões em
investimentos com a construção de
duas torres de hotéis, um centro de
convenções e... um cassino.
O prefeito do “epicentro da corrup-
ção” defende a legalização da jogatina
para salvar um projeto megalomaníaco
atolado na Zona Portuária da cidade.
Isso num Estado que tem dois gover-
nadores presos, e foram apanhados em
roubalheiras dezenas de deputados, se-
cretários do governo e conselheiros do
Tribunal de Contas. Dois cardeais da
sacrossanta Arquidiocese de Dom Eu-
genio Sales viram suas atividades tis-
nadas por malfeitos de pessoas que lhes
eram próximas. Tudo isso sem que o
jogo seja legalizado.
Um policial militar que trabalhou com
a família Bolsonaro e orgulhou-se de
“fazer dinheiro” ainda não ofereceu
uma versão consistente para explicar
suas movimentações financeiras. Um
capitão da tropa de elite da PM teve a

mãe e a mulher empregadas no ga-
binete do filho do presidente. Alcu-
nhado “Caveira”, o oficial foi expulso da
corporação e está foragido. Ele era
donatário de uma milícia da cidade.
O Rio de Janeiro elegeu um juiz para o
governo do Estado. Outro policial, que
se apresentava como seu consultor para
assuntos de segurança, está na cadeia,
acusado de extorsão. Na última eleição,
esse policial foi candidato a deputado
federal pelo partido do governador.
Sem cassinos, o Rio já está assim.
Nenhuma pessoa de boa-fé pode acre-
ditar que alguma coisa melhorará com
estímulos à jogatina e à abertura de
lavanderias de dinheiro. Ao crime or-
ganizado, Crivella quer juntar o jogo
legalizado.
O prefeito não joga, não fuma, não
bebe e sabe que está apenas criando
uma nova miragem para uma cidade
ludibriada por fantasias como as da
Copa do Mundo e a da Olimpíada. De
miragem em miragem, o Rio vive uma
eterna Quarta-Feira de Cinzas. Crivella
sabe que a reabertura dos cassinos
depende da aprovação de uma lei pelo
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