Público - 13.09.2019

(Martin Jones) #1
Público • Sexta-feira, 13 de Setembro de 2019 • 25

RALPH ORLOWSKI/REUTERS

Em vez de uma só medida muito for-
te, o BCE decidiu apostar, naquele
que será o último plano da era Draghi,
numa série de medidas de dimensão
relativamente reduzida e que em con-
junto vão tentar reanimar a economia
europeia e trazer a taxa de inÇação
para valores próximos de 2%.

Taxas de juro ainda
mais negativas

Antes da reunião, a discussão entre
os analistas era se o BCE iria reduzir
a sua taxa de depósito de -0,4% para
-0,6% ou apenas para -0,5%. O banco
acabou por optar pela segunda hipó-
tese. Ao descer ainda esta taxa, colo-
cando-a em território ainda mais
negativo, a autoridade monetária dá
um incentivo extra aos bancos para
que não acumulem reservas (sobre
as quais incide esta taxa) e passem a
injectar mais dinheiro na economia
através de empréstimos às famílias e
empresas.
Os bancos têm-se vindo a queixar
que as suas contas estão a ser dema-
siado prejudicadas por estas taxas
negativas, havendo já casos de pas-
sagem deste custo para os clientes
do retalho, através da imposição de
taxas negativas nos depósitos. Por
isso, desta vez, o BCE decidiu miti-
gar esse efeito, através de uma medi-
da adicional que isenta parte das
reservas dos bancos da aplicação da
taxa de juro de depósito negativa. As
poupanças dos bancos da zona euro
com esta medida podem ascender
aos 2000 milhões de euros, de acor-
do com a estimativa dos analistas do
ABN Amro.

Compras de dívida
sem fim à vista

No passado mês de Dezembro, com
a economia da zona euro a passar por
uma fase de crescimento e a inÇação
a dar sinais de caminhar para o objec-
tivo, o BCE deu por concluído o seu
programa de compra de activos, atra-

O último plano de Mario Draghi


para reanimar a economia


Empréstimos mais fáceis
para os bancos

A preocupação do BCE com a saúde
Ænanceira dos bancos (e com a sua
capacidade para emprestar dinheiro
à economia) Æcou também demons-
trada com outra medida. A nova
linha de crédito de longo prazo que
o banco central tinha recentemente
anunciado viu as suas condições
alteradas ainda antes da sua passa-
gem à prática.
A taxa de juro praticada vai ainda
ser mais baixa, podemos em alguns
casos chegar aos -0,5%, e o prazo dos
empréstimos pode passar dos dois
anos para os três anos. Os bancos por-
tugueses, que têm vindo a usar estes
créditos de longo prazo do BCE para
se Ænanciar, estarão na linha da fren-
te para beneÆciar destas novas con-
dições ainda mais favoráveis. Espera-
se que aproveitem esta benesse para
aumentar o crédito que concedem à
economia.

Taxas baixas
por muito tempo

Para além destas medidas que impli-
cam mudanças concretas no pre-
sente, o Banco Central Europeu
usou também um instrumento mui-
to em voga na política monetária: a
de gerir as expectativas dos agentes
económicos em relação à sua actua-
ção no futuro. Em particular, alte-
rou as garantias que dá relativamen-
te ao momento em que irá voltar a
subir taxas de juro.
Até agora, o BCE deÆnia um prazo
temporal mínimo em que se compro-
metia a não subir taxas, deÆnido para
a primeira metade de 2020. Depois
desta reunião, passou a dizer que irá
manter as suas taxas de juro “ao seu
actual nível ou mais baixo até que veja
a inÇação a convergir robustamente
para um nível suÆcientemente próxi-
mo, mas abaixo, de 2%, dentro do
horizonte de projecção”. O que esta
promessa signiÆca é que podemos
Æcar todos com mais certezas de que
a era das taxas de juro ultrabaixas está
[email protected] Lagarde entra em Novembro aqui para Æcar.

Sérgio Aníbal


(apenas 20 mil milhões de euros ao
mês). Mas o BCE acabou por ir além
do previsto ao alterar os seus com-
promissos para o futuro (condicio-
nando uma subida dos juros ao
cumprimento efectivo e sustentado
da meta de inÇação) e ao deÆnir que
o programa de compra de dívida irá
durar até pouco tempo antes de as
taxas de juro começarem a subir,
duas medidas que garantem que
teremos uma política monetária
expansionista na zona euro durante
bastante mais tempo.
Para Christine Lagarde — que irá


substituir Draghi no próximo dia 1
de Novembro — Æca uma herança
difícil. Uma economia com fraco
crescimento e ameaçada pelo “Bre-
xit” e por guerras comerciais, um
banco central com cada vez menos
instrumentos para usar, um conse-
lho de governadores dividido quan-
to ao rumo a tomar e, perante tudo
isto, a obrigação de ter de contar
com a ajuda da política orçamental
dos governos para conseguir evitar
um cenário de recessão.

vés do qual tinha adquirido mais de
dois biliões de dívida pública dos
Estados-membros, contribuindo
decisivamente para a redução regis-
tada nos últimos anos nas taxas de
juro da dívida dos diversos países
europeus, incluindo Portugal. Desde
aí, o máximo que fez foi substituir por
novas dívidas aquelas que chegam à
maturidade.
Agora, passados nove meses, o BCE
viu-se forçado a voltar atrás. Fá-lo
através da realização de compras
líquidas de activos (principalmente
dívida pública) de 20 mil milhões de
euros ao ano. É um ritmo de compras
mais baixo do que aquele que se regis-
tava no Ænal de 2018 e Æca abaixo
daquilo que eram as expectativas dos
mercados. No entanto, em compen-
sação, desta vez o BCE não deÆne à
partida um prazo-limite para a apli-
cação do programa. Limita-se a dizer
que as compras continuarão a ser
feitas até “pouco antes” de começar
a subir taxas de juro.
Este pode ser um prazo muito alar-
gado, dando quase a ideia de se estar
perante uma eternização das compras
de dívida por parte do banco central.
Nos mercados, a expectativa média
dos investidores neste momento é a
de que o BCE apenas volte a subir
taxas de juro em 2026, isto é, quando
já se estiver a aproximar o Ænal do
mandato de Christine Lagarde.

Nos mercados, a


expectativa média
dos investidores é

a de que o BCE


volte a subir taxas


de juro em 2026

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