Público - 10.09.2019

(C. Jardin) #1

16 • Público • Terça-feira, 10 de Setembro de 2019


SOCIEDADE


Em fuga há nove anos, foi apanhado


pela PSP por usurpação de identidades


RUI GAUDÊNCIO

Luís Moreira usurpou várias identidades e chegou a abrir uma empresa e uma conta bancária

Luís Jorge Lopes Moreira, de 57 anos
de idade, ex-responsável da equipa
de futsal do BenÆca — saiu do clube
em 2007 —, procurado pela Justiça há
quase nove anos, foi detido pela PSP
no, dia 27 de Junho, em Marinhais,
uma freguesia do concelho de Salva-
terra de Magos, Santarém e vai come-
çar a ser julgado em Outubro, num
processo em que está acusado de dez
crimes de falsiÆcação de documento
e de 11 por burla qualiÆcada. Segundo
a acusação, ter-se-á apropriado de
mais de 5,8 milhões de euros, ao Æcar
com o dinheiro de sinais de contratos
de promessa de compra e venda de
terrenos que não eram seus, mas para
os quais apresentava procurações
falsas dos verdadeiros donos.
O ex-dirigente do Benfica tinha
fugido de uma cadeia no Brasil, onde
aguardava extradição para Portugal,
em Outubro de 2010. Desde então,
tinha pendentes mandados de deten-
ção, mas as autoridades não sabiam
do seu paradeiro. Acabou por ser
apanhado pela PSP, que estava a
investigar um outro caso de crime de
falsiÆcação de documentos e de bur-
la qualiÆcada que envolvia a usurpa-
ção de várias identidades. Por coinci-
dência, o suspeito era Luís Moreira.
De acordo com o auto elaborado
pela PSP, no dia da detenção, foi pos-
sível identiÆcar o paradeiro de Luís
Moreira, que “se identiÆcava com
vários nomes”. Chegou, de acordo
com esse auto, a usar a identidade de
um cidadão brasileiro, e a constituir
em nome deste uma empresa, com
sede em Azeitão, cuja actividade é
construção civil e serviços de terra-
plenagens e demolições. Também
terá aberto uma conta bancária em
nome da sociedade e outra em nome
individual.
Segundo o mesmo documento,
também terá usado a identidade de
um português que faleceu em 2015,
e de outra pessoa da qual “não só
assumiu a sua identidade, como ain-
da a sua proÆssão de engenheiro
civil”. Além disso, tinha na sua posse
o cartão de cidadão e a carta de con-
dução de uma outra pessoa, que a


os processos e julgar António Baldo
e António Aragão.
António Baldo, que era, na altura
dos factos, chefe de gabinete do pre-
sidente da Câmara de Loures, foi
absolvido, tendo o tribunal entendido
que não Æcou provado que este sabia
que estava envolvido num esquema
de burla. Já António Aragão foi con-
denado a três anos de prisão, com
pena suspensa. O período de suspen-
são da pena terminou em 2016.
Quanto aos outros dois arguidos,
Carlos Lage acabou por ser extradita-
do do Brasil, e Æcou em prisão pre-
ventiva no Estabelecimento Prisional
de Lisboa. Um mês depois de ter sido
detido, foi assassinado por um outro
recluso, que estava a cumprir uma
pena de mais de 20 anos pelo homi-
cídio de um médico cubano.
Já Luís Moreira, que fugiu da prisão
no Brasil, evitando assim a extradição
para Portugal, andou desaparecido
quase nove anos e só agora vai a jul-
gamento. São 13 os lesados neste pro-
cesso, entre empresas e pessoas a
título individual. São construtores
civis que, na altura, perderam não só
os terrenos mas também o dinheiro
que deram como sinal para a compra
dos mesmos.
Abel Sereno, de 87 anos, é um dos
lesados. “Espero que seja Ænalmente
julgado. Prejudicou-me muito, Ænan-
ceiramente”, disse, alegando que já
tem alguma diÆculdade em se lem-
brar de todos os factos.
O PÚBLICO tentou contactar o
arguido, que está em prisão preven-
tiva. A advogada Marta Jorge referiu
que durante o dia de ontem não tinha
como dar conhecimento ao seu clien-
te das perguntas do PÚBLICO, mas
aÆrmou que “o acompanhamento do
processo em audiência de julgamen-
to poderá responder a essas e outras
questões”. Segundo a acusação,
“entre 2001 e 2009 o arguido Luís
Moreira, de acordo com um plano
que delineou, tem-se vindo a dedicar
à realização de contratos de promes-
sa, compra e venda, com o recurso a
documentos falsos, em conjunto com
Carlos Lage, António Baldo (que foi
absolvido mais tarde), António Ara-
gão e outros”.

Luís Moreira escapou à justiça brasileira em 2010, quando ia ser extraditado para Portugal. É acusado


de 11 crimes de burla qualiÄcada e dez de falsiÄcação. Ter-se-á apropriado de mais de 5,8 milhões de euros


Justiça


Sónia Trigueirão


[email protected]

10 de Abril, tendo sido detido mais
tarde, em Junho.
Desde o dia 27 de Junho que Luís
Moreira está detido no estabeleci-
mento prisional da Polícia Judiciária
(PJ). E já tentou dois Habeas Corpus
junto do Supremo Tribunal de Justiça
(STJ) para ser libertado. No primeiro,
tentou alegar que não foi ouvido den-
tro do período das 48 horas que a lei
determina, mas o STJ concluiu que
tinha sido, sim, interrogado dentro
da janela de tempo que a lei obriga, e
indeferiu o pedido. No segundo, Luís
Moreira alegou que, por erro do tri-
bunal, nunca foi notiÆcado na mora-
da certa e que por isso as suas faltas
são justiÆcadas, o que, argumenta,
anula o mandado de detenção.
“O arguido pensa que, ao não ter
sido notiÆcado e por esse motivo não
ter oportunidade de provar a sua ino-
cência, o que evitava a sua constitui-
ção de arguido, o processo pode vir
a ser considerado nulo, o que neste
momento não é do agrado do argui-
do, porque quer ser julgado e provar
a sua inocência perante os ofendidos

e fazer com que os verdadeiros cul-
pados sejam condenados e, o mais
importante, devolvam as quantias
provenientes da burla aos prejudica-
dos”, refere o segundo Habeas Cor-
pus. Até ao fecho desta edição ainda
não havia decisão do STJ.
O ex-dirigente desportivo também
pediu para ser ouvido novamente,
uma vez que, quando foi a primeiro
interrogatório, após a detenção, esta-
ria muito nervoso para responder,
mas o juiz entendeu que neste
momento o processo já não está em
investigação, mas em julgamento, e
que, portanto, ele poderá falar duran-
te as sessões.
No âmbito deste processo, que
começou em 2012 e que resultou da
anexação de várias queixas, foram
constituídos e acusados quatro argui-
dos: António Baldo, António Aragão,
Carlos Lage e Luís Moreira. Como
Carlos Lage e Luís Moreira estavam
em fuga e só mais tarde foram locali-
zados no Brasil, tendo sido detidos
no âmbito de mandados de detenção
internacionais, o juiz decidiu separar

Espero que seja
Änalmente

julgado.


Prejudicou-me


muito,
Änanceiramente
Abel Sereno
Lesado

polícia suspeita que tenha “furtado
ao legítimo titular, em Dezembro de
2018, e que ultimamente vinha a uti-
lizar, identiÆcando-se com esse
nome, não só em Portugal, mas em
França, onde se encontrava entre
meados do mês de Janeiro e Abril de
2019, altura em que regressou a Por-
tugal, onde esteve duas semanas hos-
pedado na região de Barcelos”.
Depois terá regressado a Marinhais a
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