Público - 10.09.2019

(C. Jardin) #1

22 • Público • Terça-feira, 10 de Setembro de 2019


ECONOMIA


A Autoridade da Concorrência (AdC)
anunciou ontem que condenou 14
bancos a operar a Portugal ao paga-
mento de coimas que, no valor glo-
bal, atingem os 225 milhões de euros
“por prática concertada de troca de
informação comercial sensível”. De
acordo com a instituição liderada
por Margarida Matos Rosa, esta prá-
tica ilegal aconteceu “durante um
período de mais de dez anos, entre
2002 e 2013”.
Os bancos condenados, diz o comu-
nicado da AdC, “são a o BBVA, o BIC
(por factos praticados pelo então
BPN), o BPI, o BCP, o BES, o BANIF, o
Barclays, a CGD, a Caixa Central de
Crédito Agrícola Mútuo, o Montepio,
o Santander (por factos por si prati-
cados e por factos praticados pelo
Banco Popular), o Deutsche Bank e a
UCI”. Em causa está a troca de infor-
mação “sensível referente à oferta de
produtos de crédito na banca de
retalho, designadamente crédito
habitação, crédito ao consumo e cré-
dito a empresas”.
Juridicamente, este não é um caso
de cartelização, embora a Adc reÆra
que “o comportamento dos referidos
bancos constitui uma importante res-
trição da concorrência”, já que tinha,
na prática, o mesmo efeito do cartel.
O esquema é explicado pela enti-
dade reguladora, ao aÆrmar que cada
instituição Ænanceira fornecia aos
seus concorrentes dados sobre as
suas ofertas comerciais, como “os
spreads a aplicar num futuro próximo
no crédito à habitação ou os valores
do crédito concedido no mês ante-
rior” e que “não seriam acessíveis”
de outro modo.
“Assim, cada banco sabia, com
particular detalhe, rigor e actualida-
de, as características da oferta dos
outros bancos, o que desencorajava
os bancos visados de oferecerem
melhores condições aos clientes,
eliminando a pressão concorrencial,


benéÆca para os consumidores”.
Por outras palavras, ao saber de
antemão o que os seus concorrentes
estavam a fazer, os bancos que parti-
ciparam neste esquema tinham pou-
co ou nenhum incentivo para dispu-
tarem os clientes com base em pro-
postas mais competitivas.
Segundo a AdC, “em sentido con-
trário à evolução de Euribor, os
spreads aplicados pelas instituições
Ænanceiras a novas operações de cré-
dito registaram uma subida acentua-
da, a partir de meados de 2018”.
Assim, a entidade reguladora deu
como provado que foi a acção irregu-
lar dos bancos que permitiu atenuar
o efeito da redução da Euribor, que
poderia ter sido mais benéÆca para
os consumidores.
“À descida abrupta da Euribor cor-
responde uma subida sustentada dos
spreads médios, que atenua a redução
da taxa de juro que decorreria da des-
cida abrupta da Euribor”, refere o
documento de perguntas e respostas
elaborado pela AdC.

Longo processo
Este era um processo que a entidade
reguladora tinha pendente desde
2015, embora o processo contra-or-
denacional tenha tido início em
Dezembro de 2012.
Ainda na presidência de António
Ferreira Gomes (o antecessor de Mar-
garida Matos Rosa), a entidade regu-
ladora acusou 15 bancos (entre eles
Caixa Geral de Depósitos, BCP, BES,
BPI e Santander Totta) “por suspeita
de prática concertada, na forma de
intercâmbio de informações comer-
ciais sensíveis, no que respeita à ofer-
ta de produtos de crédito na banca de
retalho, designadamente crédito à
habitação, crédito ao consumo e cré-
dito a empresas”.
De 15 bancos passaram agora a 14
porque, segundo aÆrma a AdC, esta
Æcou impedida de punir a prática
relativamente ao Abanca, também
visado na acusação, uma vez que
este “cessou a prática anos antes dos
restantes bancos”. De acordo com o

Depois, há ainda o caso do Santan-
der, que além da sua própria coima
Æcou com a do Popular, instituição
Ænanceira espanhola concorrente
que adquiriu em 2017. Quanto ao
Banif, que também foi absorvido
pelo Santander após o colapso do
banco português, a coima que lhe
cabe Æcou fora das responsabilidades
do Santander. O mesmo se passou
com o BES, Æcando o Novo Banco
ausente deste processo.
Outro caso interessante é o do
Eurobic, que terá de pagar pelos erros
do BPN, banco que comprou em 2011
na sequência da sua nacionalização.
De acordo com informações recolhi-
das pelo PÚBLICO, o valor máximo
de coima aplicada a uma das institui-
ções Ænanceiras visadas chegou aos
80 milhões de euros (35% do montan-
te total). O cálculo é efectuado tendo
em conta o volume de negócios de
cada banco, mas também os valores
dos segmentos em causa.

A AdC explica que, uma vez con-
cluída a decisão de condenação,
pediu um parecer ao regulador sec-
torial, ou seja, ao Banco de Portugal,
que exprimiu receios relativamente
ao impacto de eventuais coimas
para o sector Ænanceiro.

Quem denunciou
Nos anos em que, segundo a AdC,
ocorreram estas práticas, houve
uma forte concessão de crédito,
com largas centenas de milhões de
euros em Ænanciamentos a serem
aplicados, principalmente entre
2002 e 2011 (ano em da entrada da
troika de credores em Portugal).
O processo teve início numa
denúncia de uma das instituições
Ænanceiras participantes no Ænal de
2012, que aderiu ao regime de cle-
mência. O processo tardou a fazer
o seu percurso devido às dezenas de
recursos interpostos pelos bancos
em tribunal. Ao todo, foram apre-

O comportamento


dos referidos


bancos constitui


uma importante
restrição da

concorrência
Autoridade da Concorrência

Troca de informação de créditos


dá multa histórica a 14 bancos


Bancos a operar em Portugal trocavam


dados sobre produtos de crédito ao


consumo, crédito para compra de


habitação e crédito a empresas. Valor


total ascende a 225 milhões de euros


Concorrência


Luís Villalobos e Ana Brito


que apurou o PÚBLICO, a instituição
espanhola escapou à coima porque
as ilegalidades que terá praticado
prescreveram. Embora tenha ganho
expressão no mercado português
com a compra do negócio de retalho
do Deutsche Bank em Março de
2018, o Abanca já estava presente
antes disso, focando-se nas PME.

Entidade liderada por Margarida Matos Rosa decretou coimas no valor de 225 milhões a 14 bancos
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